segunda-feira, 14 de setembro de 2015

A COMPANHIA PAULISTA: O QUE FOI E O QUE PODERIA TER SIDO

Estação de Rincão - Foto Coryntho Silva Filho em 1987

A Companhia Paulista de Estradas de Ferro sempre é considerada pelos amantes das ferrovias e principalmente pelos mais velhos - aqueles que viram a Paulista funcionando - como a mais eficiente estrada de ferro do Brasil. É verdade que ela não teria sido a mais lucrativa, título que teria sido da São Paulo Railway, dos ingleses, que tiveram, por setenta anos o monopólio do acesso das cargas e passageiros ao porto de Santos, o maior porto do Brasil.

Há talvez muitas lendas na história da Paulista. Gente que diz que isso ocorria mesmo na linha-tronco, Jundiaí-Colômbia, com 506 quilômetros de linha em bitola larga. Isso sem contar os sessenta quilômetros da Luz a Jundiaí, onde ela tinha o tráfego mútuo com a SPR e com isso podia recolher os passageiros para o interior em São Paulo, que continuou com a E. F. Santos a Jundiaí e depois com a Fepasa e a RFFSA que sucederam as duas ferrovias citadas.

A história da Paulista se divide em algumas fases.

A primeira, entre 1868 e 1892, quando suas linhas eram quase todas em bitola larga (1,60 m), nenhuma bitola métrica e resumiam-se à linha-tronco Jundiaí a Descalvado e a dois ramais: o de Rio Claro e o de Santa Veridiana, este ainda não terminado na época. Fora estas linhas, a Paulista havia acabado de adquirir dois (bem) curtos ramais de bitola estreita (60 cm) que ligavam Porto Ferreira a Santa Rita do Passa-Quatro e Descalvado a Aurora. Enfim, 280 quilômetros de linha. E, finalmente, além disso, havia a navegação fluvial do rio Mogi-Guaçu, que partia de Porto Ferreira e chegava a Pontal.

Tudo isso ocorreu porque a empresa apostou em projetos que não foram aprovados pelo Governo para receber concessões de novas linhas. Quem recebeu o caminho do café para o norte da Província foi a Mogiana. Porém, em 1892 começa a segunda fase, com a Paulista comprando a Rio Claro Railqway, que tinha uma rede bastante grande, chegando a Araraquara, Jaú e com diversos projetos que avançavam.

Esta segunda fase da Paulista terminará em 1916, quando a ferrovia finalmente entrega a sua linha principal adquirida dos ingleses da Rio Claro retificada e com bitola larga. Com a terceira fase, que durará até 1941, a Paulista teve o seu ápice de fama. A linha-tronco passou a ser o trecho de Jundiaí a São Carlos (1961), depois até Rincão (1928) e finalmente até Colômbia (1930).

A quarta fase começa com a inauguração da eletrificação e aumento de bitola do seu tronco oeste (que seria terminado em 1962 unindo Itirapina a Panorama todo em bitola larga e um terço eletrificado) e termina com a desapropriação da empresa pelo governo do Estado, em meados de 1961.

A quinta e última fase termina em 1971, quando ela é incorporada à FEPASA, recém-criada. é uma fase de decadência. Em 2015, ou seja, hoje, da antiga Paulista, somente sobram, operacionais, o trecho Jundiaí-Pradópolis do tronco principal e, do tronco oeste, Itirapina-Bauru. O resto são linhas abandonadas o já extirpadas há muito tempo. O trecho Araraquara-Campinas, no entanto, é bastante movimentado em termos de cargas; não há nenhum trem de passageiros que corra qualquer trecho da velha ferrovia e isto desde 2001.

Escrevi tudo isto bastante resumidamente para tentar compreender o que devem ter sido os planos da empresa desde sua fundação até 1961. Analisando todos as linhas que a Paulista possuía ou possuiu até este ano, quais elas realmente quis ter? A pergunta é feita porque a empresa somente teria construído por vontade própria a linha Jundiaí a Descalvado (1872-1881), os ramais de Santa Veridiana (1886-1893) e o de Rio Claro (1876). O resto teria vindo como consequência da compra da Rio Claro. Esta aquisição era fundamental para a sobrevivência da Paulista numa época em que as ferrovias lidavam com zonas privilegiadas.

Quando esta compra foi feita, vieram juntos muitos proketos, alguns em andamento e outros não. Os ramais de Água Vermelha, de Ribeirão Bonito e de Agudos eram projetos da Rio Claro, bem como o ramal de Jaboticabal e a continuação até Rincão e depois para Pontal, linha que eliminou em 1903 a navegação fluvial da Paulista, um quebra-galho não muito lucrativo mas que ajudou a Paulista a sobreviver até os anos 1890.

O que teria sido o conjunto de linhas férreas da Paulista se em 1880 a Mogiana não tivesse conseguido a concessão para chegar a Casa Branca e a Ribeirão Preto e Franca e a Rio Claro, quase ao mesmo tempo, não tivesse conseguido a concessão para seguir além de Rio Claro com uma bitola métrica, com uma linha muito pior do que o trajeto que a Paulista havia sugerido para chegar a São Carlos, Araraquara e Jaú?

Qual teria sido o trajeto da Paulista para o norte e o noroeste do Estado, além Araraquara? Na verdade, relatórios pré-1880 da empresa mostram a intenção de que suas linhas chegassem até o rio Paraná, mas próximo à junção dos rios Paranaíba e Grande, em Santana do Paranaíba, Mato Grosso - não confundir com a Santana de Parnaíba, aqui na Grande São Paulo.

Nunca saberemos a resposta, mas as linhas que a Paulista construiu durante sua ascensão foram em cima de outras empresas que estavam em seu caminho, como a São Paulo-Goiaz, fundamental para que a empresa construísse sua linha-tronco de bitola larga em 1930 até Colômbia. Vários dos ramais que a Paulista tinha partindo de sua linha-tronco ou de Ribeirão Bonito foram adquiridas por necessidade, depois da ferrovia ter financiado parte da construção e manutenção de linhas deficitárias, porém tributárias importantes, como a E. F. do Dourado (a maior delas, adquirida em 1949), a parte restante da São Paulo-Goiaz (1950), a E. F. Morro Agudo (1953), a E. F. Barra Bonita (1953)  e a E. F. Jaboticabal (1952).

O tronco oeste até Panorama certamente não fazia parte de suas ideias em 1870. A região era vazia para além de Jaú e de Dois Córregos e os planos eram para seguir para o Mato Grosso provavelmente com uma linha que faria com que possivelmente a E. F. de Araraquara jamais tivesse sido construída por outra empresa.

Pode-se verificar que somente o ramal de Piracicaba (1915-1922), em bitola larga, foi construído por iniciativa da Paulista e mesmo assim por insistência e financiamento pela Prefeitura de Piracicaba.

Enfim, há inúmeros fatores não considerados aqui neste exercício de história e de futurologia, mas a Companhia Paulista de Estradas de Ferro poderia e deveria ter sido muito diferente se tivesse sido mais flexível em 1880 nas suas disputas com a Mogiana e a Rio Claro. É certo que a compra das diversas pequenas ferrovias citadas acima entre 1949 e 1953 ajudou a Paulista a ter dificuldades de caixa em 1961, quando esta foi uma dos motivos alegados para sua estatização forçada urante uma greve selvagem. Tudo indica que a falência pura e simples dessas pequenas estradas de ferro sem a devolução do que foi investido nelas deveria ter sido um golpe muito mais duro para a Paulista.

8 comentários:

  1. Pois é meu caro amigo Ralph. Para além do lado mitológico da Paulista para os seus admiradores, ele foi um caso raro no Brasil de eficiência gerencial e empresarial. Ela foi vítima de governantes com interesses equivocados, duvidosos, ou ambos, como vários outros casos da época, como o da Panair. Abraços!

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  2. Gostei de saber sobre as estações da companhia paulista de estradas de ferro C P E F.do BRASIL..

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  3. Estadão de 19.04.1916, página 5: São Carlos -
    "Sabemos que a Companhia Paulista de Eletricidade vae introduzir algumas modificações no horário da manhan, dos bondes electricos desta cidade, de que é concessionaria, de modo a poderem os mesmos servir aos trens da Paulista que, brevemente, começão a correr na nova linha de bitola larga entre esta cidade e Rio Claro."

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  4. Estadão de 18.04.1916, página 5: São Carlos -
    "Pelo sr. ministro da Viação foram approvados, recentemente, os novos horários de trens de passageiros organisados pela Companhia Paulista de Estradas de Ferro, para regular a circulação dos trens da mesma, após a abertura ao trafego, que então ficou autorisado, das novas linhas de Rio Claro a Itirapina e de Itirapina a S. Carlos.
    Provavelmente a inauguração da nova linha de bitola larga da Companhia Paulista será feita no dia 10 do próximo mez de maio."

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    1. Ralph, não entendi por que você trocou meu nome por "Amanda Cristine". Não é a primeira vez que isto acontece. Se você não gostou que eu fiz duas postagens no mesmo dia, sobre o mesmo assunto, eu posse explicar: diariamente eu entro no acervo do Estadão onde aparece a edição de 50 anos atrás. Depois de ler essa edição eu altero o ano para um século atrás. Acontece que nas décadas de 60 e 70 o Estadão não circulava às segundas, assim, no dia 18.04.2016 a edição de 50 anos atrás era a de 19.04.1966. Assim eu fui para 19.04.1916 onde encontrei o assunto do primeiro comentário. Depois eu fui para a edição de 18.04.1916 e encontrei o assunto do segundo comentário. Transcrevi essas notícias porque achei que enriqueceriam a postagem sobre a bitola larga da Paulista. Se você achar que não, pode eliminá-las, só peço para que não troque meu nome.

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    2. Não troquei seu nome! E não desgostei dos comentários. Veio com esse nome! Eu não tenho a menor ideia de porque veio com esse nome, nem sabia que era voce!!! Muito estranho isso - aliás, eu não saberia trocar seu nome - se é que isso é possivel.

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  5. Desculpe. É sempre quando eu faço um segundo comentário na mesma postagem.

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