quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

A AVENTURA DE SE IR DE PARNAÍBA A SÃO PAULO

Estação General Miguel Costa - antiga Matadouro e Km 21

Ontem, terça-feira, peguei o carro em casa por volta das oito e meia da manhã. Cheguei à Castelo Branco no tempo de sempre - pouco menos de dez minutos, mas, quando entrei, vi o trânsito parar antes ainda do pedágio. Nas duas pistas, local e expressa. Liguei o rádio e descobri que um caminhão havia derrubado carga no Cebolão. Seriam, então, nove quilômetros de horrores para chegar a ele e seguir depois por uma Marginal Pinheiros congestionada como sempre.

Peguei o rodoanel sentido Raposo Tavares. Pouco antes da metade do caminho, onde há uma saída para Osasco e Carapicuíba que dá em lugar nenhum, o trânsito também parou. Saí então e fui para Osasco. Não havia placa indicativa de nada. Só depois de passar numa rua cheia de curvas e sem placa de nome é que cheguei a uma feira. Fui obrigado a entrar para a esquerda. Acabei indo parar de novo no Rodoanel, ou melhor, ao lado dele, sentido avenida dos Autonomistas. Tudo parado. Cheguei depois de quase 25 minutos a essa avenida, em frente à estação da CPTM General Miguel Costa - aquela que se chamava Matadouro.

Pensei: vou estacionar o carro e pegar o trem para Pinheiros. Foi o que fiz, pois a Autonomistas (leia-se estrada velha de Itu) estava parada no sentido São Paulo. Não há estacionamento algum. Parei numa paralela à avenida, na rua mesmo, e segui a pé para a estação, que, afinal, estava bem próxima. Fica em Osasco, terminando quase no rio Carapicuíba, que divide essa cidade da de Carapicuíba. Parte da plataforma fica debaixo do viaduto do rodoanel.

Estava quase vazia. Tem uma entrada única, que você já entra subindo a escada e lá em cima é que estão as catracas. Descendo de novo, a plataforma. Esperei menos de cinco minutos e o trem chegou. Entrou na estação "largando o pau", dando a impressão de que não ia parar. Parou. Entrei: estava cheio, mas ainda dava para se mexer com folga. Na estação seguinte, Quitaúna, onde ele entrou em velocidade devagar quase parando (por que a diferença?) ninguém entrou ou saiu, pelo menos no carro em que eu estava - o trem tinha oito carros.

Cheguei a Presidente Altino, onde desci; na mesma plataforma, tomei logo em seguida o trem para o Grajaú, via Pinheiros, que já estava chegando. Daí para a frente, estações quase vazias. Desci na estação Rebouças e fui a pé para o escritório - sete minutos de caminhada debaixo de um calor de pelo menos 29 graus.

À tarde, outra andada até a estação. Peguei o trem, que estava chegando ao mesmo tempo em que descia a escada rolante. Entrei. Na estação seguinte, Pinheiros, ele mandou todos descerem e seguiu, vazio. Eram cerca de cinco e pouco da tarde, por que isso? Espero outro trem, que demorou mais de cinco minutos. Desci de novo em Altino, onde outra vez na mesma plataforma tomei o trem para Itapevi. Desembarquei, claro, em Miguel Costa.

Eram seis da tarde. A estação parecia, realmente, um matadouro. Saída unica: uma escada pequena demais para tanta gente. Igualzinho a gado entrando nos caminhões da morte... mas todo mundo paciente, educado. Era, sem dúvida, o horário de pico dessa estação - eu realmente não esperava que tanta gente descesse ali.

Fui até o carro e com ele fui para casa. Perdi muito tempo nesse dia, mas tomar o trem, mesmo com o percalço na volta, valeu a pena. O problema de trânsito em São Paulo não tem solução, principalmente porque, com tantos veículos, grandes e pequenos, sempre vai ter algum que vai causar um acidente e parar tudo. Se não é no Cebolão será em outro lugar.

Eu, por mim, usaria sempre o trem. Porém, os ônibus que ligam os Alphavilles parnaibanos às estações de Barueri e de Carapicuíba dão voltas demais e demoram muito tempo para chegarem ao destino. Ir de carro é problema, pois não há locais para estacionar junto às estações.

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

O FIM DA ESTAÇÃO DE BOTUCATU?

Foto André Godinho

A noticia foi-me enviada na última sexta-feira. Nossa cuidadosa concessionária ALL mais uma vez danifica uma estação. Desta vez, foi-se a cobertura da gare de embarque de Botucatu (bom, de embarque, não, pois faz pelo menos 13 anos que ninguém - ou nada - embarca lá!).

É lamentável que isso continue ocorrendo. Já aconteceu em Campinas, há cerca de 5 anos. Não foi a ALL naquela vez. Mas isto não poderia deixar de fazer parte do currículo de nossa cuidadosa concessionária, numa época em que não se treina ninguém - muito menos maquinistas.

Transcrevo a notícia, do Do G1 Bauru e Marília:

"Composição de trem derruba teto de estação ferroviária em Botucatu, SP
Ninguém se feriu.
Os vagões estavam carregados de trilhos e dormentes.

Uma composição de trem com oito vagões atingiu dois pilares da antiga estação ferroviária de Botucatu, interior de São Paulo (nota deste blogueiro: da estação, não, da cobertura de ferro, datada dos anos 1930). O acidente aconteceu na tarde desta quinta-feira (23). Os vagões estavam carregados com trilhos e dormentes que seriam usados para o reparo da ferrovia. O trem vinha Bauru e seguia rumo a Mairinque.

Alguns pedaços de ferro cortados foram colocados nas laterais dos vagões como proteção, mas não suportaram o peso e ficaram pendurados. Ao chegar na estação, os pedaços colidiram com os pilares, um deles foi arrancado e o outro entortou. Ninguém se feriu.

Há poucos dias, o prédio da antiga estação foi tombado pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico do Estado (Condephaat). As obras referentes à revitalização irão custar R$ 600 mil e pretendem recuperar a cúpula, o antigo bar e estruturas de madeira.

A Prefeitura de Botucatu irá cobrar os danos causados pelo acidente à América Latina Logística (ALL). Em nota, a ALL informou que foi aberta uma sindicância para apurar o que aconteceu."

Para a prefeitura de Botucatu, foi como sopa no mel: há treze anos que a estação está abandonada e os prefeitos não fizeram coisa alguma, agora podem cobrar uma recuperação da ALL. Duro vai ser fazer o pessoal pagar. Se o CONDEPHAAT não cobrar esse conserto com firmeza, a estação vai acabar se deteriorando mais rápido ainda.

Mais um pedaço da memória de São Paulo está ameaçada de se esvair. Para o pessoal que não se importa (a maioria) e para os que acham que aquilo é uma velharia inútil (que não são poucos), o que ocorreu deve ser motivo de alegria.

Porém, para quem se importa com a memória e as tradições, dois dos fatores mais importantes para a formação de um povo e de sua nacionalidade, a destruição de mais um bem é um fato desgastante.

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

VERONICA

Veronica, de branco, ao centro: o retrato da felicidade

Estive praticamente ausente deste blog durante os últimos vinte dias. Deve ter, claro, dado para os leitores perceberem. Se não perceberam, é por que este blogueiro é fraco demais.

O motivo da quase parada total foi o casamento de minha filha. A mais nova de meus três filhos e a única mulher. Quatro anos mais nova que meu segundo filho e cinco anos que meu primogênito, a jovem Verônica, com sua voz eterna de criança e seus olhos lindos e tristes conseguiu encontrar seu príncipe encantado.

O rapaz, seis anos mais velho que ela, mora no Rio de Janeiro há seis anos e é italiano. Nasceu e viveu a vida inteira em Pistoia, na Toscana, a vinte quilômetros de Lucca e quarenta de Florença, a bela Firenze.

Enquanto isso, Veronica viveu a vida toda em Santana de Parnaíba, tendo nascido na Pro-Matre de São Paulo. Estudou na Capital e se formou em administração há nove anos. Seu pai - eu - sou paulistano, enquanto sua mãe, Ana Maria, é carioca de Niterói - nasceu na cidade do Rio mas foi registrada do outro lado da baía. Mais para trás, os avôs paternos eram, ele, de Ponta Grossa, PR, neto de alemães, enquanto ela, minha mãe, paulistana. Meu avô, bisavô de Veronica, era de Piracicaba. Seus pais, de Lucca, Toscana. Casaram-se em Pistoia, nos anos 1880. Veronica fecha um ciclo.

Veronica merecia uma festa no seu casamento. Ela foi feita em nossa casa, em Santana de Parnaíba. Ana Maria e sua irmã Daisy transformaram a casa em um salão de festas. Foi um trabalho magnífico, em que as duas irmãs mostraram que são mulheres fantásticas que sabem o que querem e que conseguem chegar a um objetivo: fazer Veronica gostar demais de uma festa da qual se lembrará pelo resto de sua vida.

Muitos amigos e amigas do casal e as famílias. Dele, pai, mãe e uma tia, que vieram de Pistoia e que para isso saíram da Italia pela primeira vez em suas vidas. Saíram de uma cidade de nem cem mil habitantes para uma chamada Grande São Paulo com dezenove milhões. É verdade que Parnaíba tem pouco mais de cem mil, mas quem nota que a cidade, praticamente incorporada hoje à Capital, existe?

Que minha filha seja a mulher mais feliz do mundo. Para mim, será sempre a minha menininha. Para sua mãe também. Veronica viverá na Toscana. Dizem que é a região mais bonita da Italia. Minha filha merece. Serão doze mil quilômetros de distância de seus pais, mas que não a separará de nós.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

O RAMAL DE PASSOS FAZ CEM ANOS

Locomotiva que inaugurou o ramal de Passos, de Guaxupé a Guaranésia, em 23/6/1912

O ramal de Passos, construído pela Companhia Mogiana de Estradas de Ferro, completa cem anos neste ano da graça de 2012. Na verdade, o que faz centenário em junho é a abertura do primeiro trecho dessa linha que ligava a cidade mineira de Guaxupé - na divisa com São Paulo - à cidade de Passos.

Esse trecho inicial tinha cerca de quinze quilômetros e unia Guaxupé a Guaranésia. A Mogiana tinha diversas linhas em território mineiro, tendo sido a primeira delas a linha de Caldas, que ligava Cascavel (hoje Aguaí) a Poços de Caldas, também na fronteira paulista, seguida da linha do Catalão (estação de Jaguara, junto ao rio Grande, até Araguari). Quase ao mesmo tempo, a linha Casa Branca-Guaxupé. Logo depois, o ramal de Itapira, que chegava a Sapucaí, pequeno vilarejo pertencente ao município mineiro de Jacutinga. Finalmente, as três linhas que partiam de Guaxupé rumo a Biguatinga, Muzambinho e esta, de Passos.
Locomotiva diesel na estação de Guaranésia, anos 1970

As linhas de Guaxupé foram construídas com um empréstimo que a Mogiana recebeu no final da primeira década do século XX com a finalidade de construir sua linha para o porto de Santos. Com grandes empecilhos criados pela São Paulo Railway, tal qual em 1891, a Mogiana desistiu do projeto e optou por usar o dinheiro na construção de ramais "cata-café" na região mineira junto à paulista Mococa. Esta foi a origem dos três ramais construídos com ponto de partida nessa cidade.
A estação de Itiguaba em 2011

O ramal de Passos foi sendo prolongado aos poucos. Em setembro de 1912, chagou a Catitó, pequena estação de fazenda. Dois meses depois, a Itiguassu. Mais quatro meses e já estava na estação central da cidade de Monte Santo. Em agosto de 1913 avançou duas estações e chegou a Posses (hoje Itamogi, depois de se chamar também Arary), passando por Vicente Carvalhaes. Como se pode ver, todas estações de coleta de café em fazendas, com exceção das duas centrais.

Em setembro de 1914, abriu um novo trecho de trinta quilômetros, com três novas estações: Tapir, Ipomeia e São Sebastião do Paraíso. Esta última era estação de cidade, construída a alguns metros de onde já estava, havia quatro anos, outra estação da E. F. São Paulo a Minas. Como aconteceu em diversas cidades brasileiras, as ferrovias preferiam, em lugar de juntarem forças e dividirem estações, construir cada uma delas a sua própria, nem sempre unindo as linhas para complicar a vida do rival - e, indiretamente, a sua.

Plataforma da estação de Pratápolis em 2006

Somente cinco anos depois a Mogiana avançou mais sua linha. Em agosto de 1919, foi inaugurado outro trecho de trinta quilômetros: a vila de Espírito Santo do Prata era a estação terminal provisória, que recebeu o nome de Pratápolis, dado pela Mogiana. Havia mais uma estação intermediária: Itaguaba. A Guerra Mundial certamente interferiu nos gastos para o término do ramal. E mais: apenas em abril de 1921 foram abertos mais vinte quilômetros até Itaú de Minas, onde depois se instalou a fábrica de cimento Itaú, que por sua vez foi o berço do Banco Itaú, ali aberto depois como o braço financeiro da fábrica.

Finalmente, em dezembro desse mesmo ano, oito meses e vinte e seis quilômetros depois, a ferrovia chegou ao seu final planejado inicialmente: a cidade de Passos. Ali foi construída a maior das estações da linha, já com um estilo que começava a ser o preferido das estações da Mogiana erigidas até os anos 1940. Um grande pátio e armazéns a acompanharam para receber o café que chegaria das cidades além do terminal. Aliás, fala-se que um prolongamento até a cidade de Piumhy (com u em som nasal) teria sido rasgado pela ferrovia, existindo até hoje diversos cortes à frente de Passos feitos com este objetivo.
Estação de Passos em 2006

Com relação à arquitetura, nota-se que as primeiras estações construídas no ramal de Passos, até Ipomeia, ou seja, as que foram abertas até 1914, conservam o estilo arquitetônico das pequenas e médias estações da Mogiana do princípio do século: duas águas, frontão triangular dos dois lados e tijolos à vista. A partir de 1919, o estilo já se altera e Passos é a sua melhor caracterização, segundo Julio Moraes: "O formato e decoração das janelas, a decoração dos panos das fachadas, enfim, toda a 'cara' das fachadas foi intensamente copiado na arquitetura civil, exemplificando a influência que a arquitetura ferroviária exerceu sobre o 'gosto', a referência estética que criou para toda a população. Isto é apenas mais um dos muitos aspectos em que a ferrovia definiu muito do caráter da nossa cultura, e nesta estação percebemo-lo muito bem".

Por sim, pouco depois da finalização do ramal, em data incerta, foi aberto um posto telegráfico de nome Morro do Ferro, entre as estações de Itaguaba e Pratápolis, cuja função seria embarcar minério de ferro ali existente para a Usina Metalúrgica de Ribeirão Preto, utilizando, para isso, a linha da São Paulo-Minas a partir de São Sebastião do Paraíso. Com a falência dessa indústria em 1930, o posto ainda seguiu funcionando até 1958, quando fechou.

Em 1968, a São Paulo e Minas passou para a administração da Mogiana. Em novembro de 1971, as duas ferrovias, com outras três, formaram a FEPASA e isso unificou de vez as duas linhas. Bastante deficitária na época, o trecho construído entre 1912 e 1914 foi extinto não muitos anos depois, unindo-se o trecho de São Sebastião do Paraíso com o da ex-SPM através de uma variante por fora da cidade, que fechou as duas estações existentes. Os trens de passageiros em todo o ramal e na ex-SPM foram extintos todos em 1976. Aliás, desde a falência da usina de Ribeirão Preto e logo depois a queda vertiginosa do transporte do café, os trechos já não eram atrativos, restando pouco o que carregar. Em data que parece ter ocorrido por volta de 1980, o trecho entre Itaú e Passos foi abandonado e os trilhos, retirados. Havia apenas cargas de cimento de Itaú para São Paulo. A partir dos anos 1990, nem isto.

Hoje, não há nada a comemorar além de trilhos velhos abandonados no meio do mato e velhas e bonitas estações largadas ao longo da linha. Pelo menos três não existem mais. As únicas que conheci pessoalmente, há cerca de seis anos, foram as de Pratápolis, Itaú de Minas e a de Passos. Valeram a pena.

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

É CARNAVAL EM 1940

Folha da Manhã, 4/2/1940

Bom, será... ele começa depois de amanhã, sábado de Carnaval. Lembremos então que o carnaval de 1940 em São Paulo, ainda na época do corso de automóveis, seguiria por todas essas ruas que se vêem acima. Avenida Paulista, Brigadeiro Luiz Antonio, Avenida São João, Avenda Angélica. Dava a volta na Praça Buenos Aires e retornava.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

UMA RESPOSTA MUITO DIFÍCIL

Diário de Penapolis

Tem sido realmente difícil entender como este país tem progredido tanto nos últimos, digamos, cinquenta anos. Houve períodos de semiparalisia, mas o fato é que houve progressos.

E é difícil de acreditar, quando se lêem coisas como as que tenho lido nos últimos dias. Uma delas fala sobre o descalabro do monotrilho de Poços de Caldas. Outra, sobre um acidente entre um trem e um automóvel em Penápolis, SP. E também sobre o fato de uma visita da presidente da República às obras da Trannordestina ter sido cancelada em cima da hora por terem descoberto que as obras estavam praticamente paralisadas.

Há muito mais exemplos. Vou me ater a estes três. No caso do trem em Penápolis, é certo que um dos motivos foi o de não haver sinalização no cruzamento da linha com a rua. É um absurdo não existir esta sinalização, principalmente porque, até 20-30 anos atrás, tudo o que era cruzamento ferroviário tinha ou avisos de cruzamento, ou cancelas. Hoje, isso praticamente não existe mais, pois concessionárias e prefeituras brigam entre si, cada uma afirmando que o problema é da outra parte. Mas o que realmente me assunsta é que as pessoas, na falta de sinalização ou cancelas, perderam o bom-senso de olhar para os lados quando vêem à frente uma linha ferroviária. É o mínimo que se pode esperar de um cidadão que tenha carteira de motorista.

No caso da Transnordestina, suponho que uma pessoa específica tenha preparado toda a viagem para a Presidente. Visto horários de vôos, pessoas participantes, etc. Mas se esqueceram, pelo visto, de avisar as empreiteiras e - pior - de conferir se realmente estavam trabalhando naquele ponto das obras. Aí, alguém descobriu (antes da viagem) que havia um problema. Por que não conferiu isto alguns dias antes? Por que anunciou a viagem à imprensa sem conferir isto? E, pior, por que a empreiteira está com as obras paradas? A isto, ninguém até agora deu a resposta. O fato é que a Transnordestina somente teve até agora cerca de quinze quilômetros entregues - o que, para um ferrovia, não é coisa alguma. Deveria estar pronta em 2006. Depois, em 2008. Depois, em 2010, 2012... hoje, já falam em 2014.

E, por fim, o monotrilho de Poços. "Talvez o projeto mais antigo inacabado do país, completou 30 anos, em 20 de agosto de 2011, e ainda não apresenta sinal de solução para a conclusão. A empresa detentora da concessão municipal, por 50 anos, até 2031, a J Ferreira Ltda, executou menos de um terço (8 km) dos 30 km previstos. Ao final da concessão, o patrimônio do modal seria revertido ao município. Da inauguração, logo após dada a concessão, o monotrilho de Poços de Caldas, que era o único a funcionar no país no sistema ferroviário de transporte de massa, circulou poucas vezes. Oito anos depois, encerrou sua presença nas vias públicas da cidade". O trecho entre aspas foi tirado de uma reportagem de hoje, de Nairo Alméri (Notícias S. A.). O fato é que, depois disso, segue o artigo, houve brigas entre a Prefeitura e a empresa. E nada foi resolvido depois de anos e anos sem funcionar e com uma parte acusando a outra.

Por que essas coisas somente acontecem no Brasil? Será que ocorrem em outros países de economia considerável? Parece que o Brasil é hoje a sexta economia no mndo, né? Como?

Tirem suas próprias conclusões.

sábado, 11 de fevereiro de 2012

OS TRILHOS DO MAL (VII) - O MPF ACERTOU!

A estação do Barracão, de onde saem os trilhos do ramal de Sertãozinho em Ribeirão Preto desde 1899

A prefeitura de Ribeirão Preto, aquela que derrubara há quarenta e quatro anos sem nenhuma necessidade a estação ferroviária construída oitenta anos antes, agora está maluca para arrancar os trilhos do ramal de Sertãozinho, desativado pelas concessionárias privadas logo depois da entrega da linha da FEPASA a elas, no final de 1998.

O MPF - Ministério Público Federal -, que normalmente interfere em muita coisa, sendo que muitas vezes por mera politicagem ou sem fundamentos melhores do que os usados pelos "interferidos", desta vez entrou em ação com fundamentos muito bem colocados e com toda a razão do mundo.

Nas quatro cartas abaixo reproduzidas por mim - o texto é longo, mas, sinceramente, vale a pena lê-los, pois especialmente o primeiro, apesar de em alguns pontos ser repetitivo, mostra algumas posições muito clras até para leigos. Posições, que, no entanto, não parecem nada claras para as concessionárias - no caso, a FCA - nem para o governo municipal, estadual ou federal.

Leiam abaixo e vejam que, desta vez, o procurador que as emitiu está de parabéns pela serenidade e clareza. A primeira carta é a mais longa. Os grifos são deste blogueiro. Há citações de fontes que aqui eliminei, para não sobrecarregar demais.

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - PROCURADORIA DA REPÚBLICA EM RIBEIRÃO PRETO (SP)

DECISÃO - Peças informativas nº 1.34.010.000323/2011-10

As presentes peças informativas têm por objetivo apuração da denúncia, trazida a este órgão ministerial pelo presidente do INSTITUTO HISTÓRIA DO TREM, Denis Willian Esteves, e também veiculada em matérias jornalísticas1, de que o MUNICÍPIO DE RIBEIRÃO PRETO (doravante MUNICÍPIO) estaria planejando eliminar ramais ferroviários em desuso da antiga Companhia Mogyana, situados na zona urbana, ou dar-lhes nova afetação. Para tanto, a concessionária FERROVIA CENTROATLÂNTICA S.A. (doravante FCA) devolveria as áreas de tais ramais à UNIÃO, que, por meio do DEPARTAMENTO DE INFRAESTRUTURA DE
TRANSPORTES – DNIT, cedê-las-ia ao MUNICÍPIO. Em contrapartida, a UNIÃO custearia a construção de um novo ramal, mais afastado das concentrações populacionais.

Ocorre que o negócio ostenta, pelo menos, três sérios inconvenientes, a saber:
- sem justa causa, oneraria o MUNICÍPIO e desoneraria a concessionária FCA, ao carrear para o primeiro a responsabilidade, em princípio da segunda, pela recuperação dos ramais abandonados e a desocupação de suas margens, atualmente ocupadas por construções irregulares de famílias de baixa renda. Nesse ponto, merece destaque o seguinte trecho da reportagem constante da f. 79: “Segundo José Osvaldo Cruz, coordenador de relações institucionais da FCA, o trecho se tornou inviável por causa das intervenções urbanas”;
- sem justa causa, oneraria a UNIÃO e desoneraria a concessionária FCA, ao carrear para a primeira a responsabilidade de custear a construção de novo ramal em razão de o ramal já existente não ter sido devidamente aproveitado ou recuperado pela concessionária;
- inviabilizaria o projeto de trem histórico-cultural, que o MUNICÍPIO, por sua Secretaria da Cultura, afirma encampar.

Com o fito de evitar lides judiciais e prevenir responsabilidades acerca desse contexto fático, este subscritor, por meio de ofício, participou sua visão desses inconvenientes ao DNIT, ao MUNICÍPIO e à Agência Nacional de Transportes Terrestres – ANTT, ao mesmo tempo em que requisitou informações sobre o andamento de eventuais tratativas entre as partes.

Em resposta, a ANTT esclareceu que o inciso XIV da cláusula 9.1 do contrato de concessão2 abrange a obrigação da concessionária FCA de impedir ocupações irregulares (favelas e congêneres) nos terrenos marginais aos ramais ferroviários. Todavia, ressaltou que a construção de vias férreas fora dos contornos urbanos visa a evitar prejuízos para a população, que pode sofrer, por exemplo, com a poluição sonora e com o risco acidentes, acrescentando ainda que a construção de contorno ferroviário pela UNIÃO não desoneraria a FCA, pois esta última pagaria a devida indenização à primeira.

Por sua vez, o MUNICÍPIO esclareceu que:
(i) as tratativas para a reportada cessão de áreas realmente existem, mas não foram formalizadas;
(ii) foi firmado com a FCA protocolo de cooperação (trazido por cópia em versão com lacunas e não assinado), segundo o qual esta e o MUNICÍPIO envidarão esforços conjuntos para implementação de projetos e investimentos urbanos e ferroviários;
(iii) não há projeto oficial
quanto ao uso dos terrenos que poderão ser recebidas pelo MUNICÍPIO; e
(iv) quanto à remoção das ocupações nos terrenos marginais, seriam elas incluídas no programa municipal de desfavelização.

Finalmente, o DNIT informou que
(i) o MUNICÍPIO demonstrou interesse no recebimento das áreas dos ramais, solicitando
análise quanto à viabilidade do negócio;
(ii) houve uma reunião em Brasília/DF na qual se discutiram questões relativas ao transporte ferroviário em Ribeirão Preto/SP (foi trazida cópia da ata);
(iii) a responsabilidade de remover as favelas dos terrenos marginais é da FCA, sob fiscalização da ANTT;
(iv) não foi realizado nenhum estudo sobre a conveniência de construção de novo ramal, em vez de reativar o já existente;
(v) o traçado atual está muito antigo, o que pode trazer riscos à população;
(vi) após análises, constatou-se que, para reativar a malha ferroviária, seria necessário fazer um contorno fora do perímetro urbano.

É o relatório.

Antes de tudo, repise-se que estas peças informativas tiveram início com denúncia, feita por entidade privada vocacionada para a preservação da memória ferroviária, de que o MUNICÍPIO estaria planejando eliminar ramais ferroviários em desuso da antiga Companhia Mogyana, situados na zona urbana, ou dar-lhes nova afetação. O fato assim definido, sem maior contextualização, não ostenta nenhuma ilicitude. Tanto que foi, nesses mesmos termos,
confirmado pelas partes que a ele dão curso (MUNICÍPIO, DNIT e FCA).

O problema reside nas implicações desse fato e no modo como ele venha a se perfazer. Daí porque o caso é de relativa complexidade, merecendo atenção para sutilezas e detalhes. Não se tratando de fato ilícito prima facie, carece este órgão ministerial de razões para impugná-lo de plano. Afinal, não cabe ao Ministério Público ditar ao administrador a destinação a ser dada a bens em desuso. Porém – e aqui ingressamos no âmago da questão – , em se tratando de bens de extraordinário potencial de uso em prol do tecido social, notadamente no que diz respeito à mobilidade urbana, não pode ser destinado sem maior critério. E, por critério, compreendam-se não apenas decisões políticas, mas estudos e análises cientificamente respaldados, lançados sobre premissas objetivas tendentes a divisar, no longo prazo, os mais proveitosos empregos em favor da comunidade.

É claro que haverá margem para opções políticas, para a inequívoca discricionariedade administrativa. Até porque – veja-se! – a opção até aqui engendrada foi o abandono, teoricamente a pior de todas. Porém, nem de longe isso significa que qualquer outra opção seja válida. Afinal, o abandono de determinado bem não gera despesa direta; quando muito, depender de sua natureza, gera depreciação que, exacerbada, aí sim pode caracterizar malversação. A destinação pretendida pelos atores das negociações até aqui encetadas, ao contrário, gera despesa direta de considerável valor e, mais que isso, cria uma afetação com nota de definitividade.

Se assim é, se o que se pretende até aqui (novo ramal fora da cidade e transformação dos atuais em corredores de ônibus) são transformações de grande monta e elevado custo, que aderem ao solo e que ditam a conformação do entorno no longo prazo, é impensável que qualquer movimento, ainda que de mera cessão de áreas, seja feito sem grande segurança quanto à finalidade, calcada esta em razoabilidade e proporcionalidade.

A razoabilidade, no caso, implica ter certeza quanto à adoção de uma opção eficaz em termos de aproveitamento; e a proporcionalidade, por sua vez, expressa relação de custo/benefício que
não seja perniciosa para o poder público. Pelo menos até este momento, essa segurança
finalística apoiada em razoabilidade e em proporcionalidade não se faz presente. A impressão que se tem é que as deliberações, até aqui, foram de cunho estritamente político; que pouco ou nada transitaram pelo universo técnico.

Um protocolo de cooperação (juntado a estes autos em forma incompleta e sem assinatura) e a notícia de uma reunião em Brasília e de uma singela visita técnica que resultou num croqui,
obviamente, estão aquém do necessário para deflagrar o processo, com a cessão dos imóveis da UNIÃO ao MUNICÍPIO.

Com efeito, não existe demonstração técnica sobre a inviabilidade operacional dos atuais ramais. O DNIT informa que, em inspeção técnica, constatou que “o traçado ferroviário no trecho urbano encontra-se técnica e operacionalmente inviável por ser um traçado antigo, com raios e rampas inadequados, e com muitas passagens de nível, tornando-se assim um risco à população”. Deveras, não convence. Muitas perguntas podem ser arrostadas a essa assertiva. Só como exemplo:

- Raios e rampas inadequados não podem ser objeto de adequação?
- Passagens de nível não podem ser desniveladas, principalmente para o tráfego de pedestres (passarelas)?
- Quanto aos veículos, qual o inconveniente de semáforos, queexistem às centenas pela cidade?
- Traçado antigo, por si só, é um óbice insuperável? Por que?

Todos sabemos que, nos países mais civilizados do planeta, notadamente na Europa, o transporte ferroviário convive em harmonia com as cidades há muitas e muitas décadas. Será que todos os
traçados são novos? Que justamente lá não existem traçados antigos? Grandes estações ferroviárias estão presentes, muitas vezes, no centro das principais aglomerações urbanas. A despeito disso, a notícia que se tem é a de que as cidades europeias são as que oferecem maior mobilidade e segurança para seus habitantes.

Veja-se, nesse sentido, a seguinte reportagem, voltada para viajantes brasileiros na Europa:
Quem viaja pelo mundo já sabe que os passes de trem são uma das melhores formas de percorrer a Europa. O STB – Student Travel Bureau, que comercializa bilhetes de trem e
passagens aéreas para destinos europeus, com diferenciais para cada faixa etária e para quem viaja sozinho ou em grupo, faz um comparativo das vantagens e desvantagens das viagens de trem ou avião entre esses países. Segundo o gerente de Travel do STB, Henrique Braga,
na Europa existem 240 mil quilômetros de trilhos conectando 20 países, com muita praticidade e vantagens para os viajantes. (…)

Braga ressalta ainda outras vantagens das viagens de trem: geralmente as estações situam-se muito próximas aos centros das cidades, facilitando o deslocamento. Ombreando a ausência de conclusão segura sobre a inviabilidade operacional dos atuais ramais está a inexistência de estudos técnicos sobre a economicidade dos negócios pretendidos (relação custo/benefício para o poder público). Aqui as perguntas são ainda mais renitentes, tanto quanto básicas, como as seguintes:
- Quanto custará para a UNIÃO construir o novo ramal para uso da FCA?
- Como será a UNIÃO indenizada?
- Quais serão, concretamente, as vantagens econômicas do novo ramal? Quem as auferirá?

Semelhante ausência de respostas firmes e técnicas pode ser apontada quanto à pretensão do MUNICÍPIO de remover os ramais para, em seu lugar, erigir corredores de ônibus. Nesse passo, calha também notar que um dos ramais que se pretende eliminar corre, em boa medida, próxima e paralelamente a via pública de larguíssimo calibre, a Avenida Eduardo Andrea Matarazzo.
Começa a se tornar notório, mesmo entre os leigos, o fracasso da opção de favorecer o transporte sobre rodas, em vez do transporte sobre trilhos. Viadutos, contornos ou complexos viários, elevados, pontes, túneis, semáforos inteligentes, rodízio de veículos, horários para circulação, nada disso foi capaz de deter a semi-paralisia que afeta cidades como São Paulo, que, ao longo de décadas, deram primazia ao asfalto.

Ademais, obras viárias de grande porte como essas não raro têm o deletério efeito de “desumanizar” as cidades, “rasgando-as”, agredindo sua paisagem, servindo de painel para pichadores, de fonte de barulho para moradores e de tantas outras mazelas, sem falar no favorecimento à poluição pela queima de combustíveis fósseis. Basta lembrar que, agora,
quarenta anos depois de ter sido erguido e de ter produzido forte degradação urbana ao seu redor, o “Minhocão”, como é conhecido o Elevado Costa e Silva, em São Paulo, é objeto de um projeto de demolição da prefeitura.

O terrível vezo político da ausência de planejamento de longo prazo para mobilidade urbana não deve prevalecer numa cidade que já ultrapassou a marca dos 600 mil habitantes, sob pena de estes, no médio e longo prazos, serem submetidos a diuturno desgaste para deslocamentos, pondo-se a perder boa parte da chamada “qualidade de
vida” interiorana.
Também é absolutamente impensável que o MUNICÍPIO adquira a área em questão sem saber ao certo o que fazer com ela. Ou, pior, que a adquira com um intuito momentâneo que, implementado às pressas ou sem maior reflexão, precise ser alterado futuramente, por não se revelar adequado, o que remete ao triste exemplo do Minhocão. Ora, uma vez eliminados os ramais – assim entendidos não apenas os dormentes, trilhos e demais equipamentos férreos, mas principalmente a adequada conformação do solo e do terreno –, sua reposição, após constatar-se que o corredor de ônibus não passa de uma quimera política, afigurar-se-ia no mínimo canhestra.

A indagação primeira seria: por que retirar para depois repor, se tanto tirar quanto repor é
caro? Se é que o modal férreo representa a melhor solução técnica para o local, por que não adaptar, modernizar ou reconfigurar o que se tem? É evidente que, para se duplicar uma rodovia, não é necessário fazer desaparecer a pista simples preexistente. Muito ao contrário, haverá grande aproveitamento da obra anterior.

Como se vê, as questões que não calam nesse aspecto do pretendido negócio são:
- O MUNICÍPIO realmente necessita de corredores de ônibus no local onde hoje estão os ramais abandonados? Onde está o embasamento técnico para essa conclusão?
- O transporte por meio de ônibus é mesmo a melhor alternativa de aproveitamento das áreas para a mobilidade urbana? Não seria o caso de se aproveitarem, além das áreas, os próprios ramais nelas existentes, para a implementação de um modal ferroviário, dando-se início à inversão da lógica claramente nociva da primazia do asfalto?

Outra questão a ser ponderada é a remoção das ocupações irregulares nas áreas em tela, às margens dos ramais. De acordo com o contrato de concessão e segundo a visão da própria ANTT,
essa incumbência pertence à concessionária de transportes ferroviários. Ora, se a responsabilidade por tão oneroso mister recai sobre a FCA, qual a justa causa para o MUNICÍPIO assumi-la sem nenhuma contrapartida? Simplesmente afirmar-se que a região pode ser incluída no programa de desfavelização soa como uma tremenda minimização do problema. Por mais que o programa exista e seja efetivo, a inclusão de novas áreas obviamente onera o erário municipal, ainda que de forma pouco clara à primeira vista.

Por fim, mas não menos importante, não se pode perder de vista a legítima e valorosa pretensão da sociedade civil, por meio do INSTITUTO HISTÓRIA DO TREM, de preservar a memória ferroviária da cidade e da região. Por força de provocação dessa mesma e combativa
associação, este órgão ministerial intentou ação civil pública (autos nº 0010837-73.2010.403.6102; 1ª Vara Federal de Ribeirão Preto) na qual se prolatou liminar que bloqueou indevida transferência de bens ferroviários de valor histórico para outra urbe, ameaça que adveio de concerto entre o DNIT e o município que almejava receber esses bens.

Tendo sido o ponto de partida destas peças informativas, a advertência do INSTITUTO HISTÓRIA DO TREM, que tem revelado extrema vocação para o fim associativo a que se propõe, é no sentido de que a eliminação dos ramais em foco pode pôr a perder antigo anseio de criação de museu ferroviário nesta cidade, que a Secretaria da Cultura afirma encampar em caráter prioritário (f. 34, 43/47 e 52/56). Isso porque a realidade tem mostrado que museus ferroviários só se tornam atrativos quando oferecem para seus frequentadores a opção de passeio em trem histórico-cultural (f. 49), que, no caso de Ribeirão Preto, só poderia ser viabilizado em algum ponto dos ramais atuais (f. 6).

É notório que o transporte ferroviário de passageiros já foi usado em larga escala neste Estado, tendo experimentado grande apogeu em meados do século passado. As ferrovias eram instituições de grande envergadura e prestígio. Daí a importância da preservação dos bens
remanescentes em museu: revelar às atuais gerações a capacidade de nosso povo de erigir instituições grandiosas, extremamente úteis e dotadas de soberba tecnologia, como foi a Companhia Mogyana, instigando assim, nas pessoas, o senso cívico e de coletivismo – tão desbotado e que, desafortunadamente, só tem aparecido em tempos de copa do mundo de futebol.

Como fica fácil perceber, a legitimidade do Ministério Público para, a despeito da discricionariedade administrativa – e sem prejuízo dela – , questionar o pretendido negócio é ampla e apresenta vários flancos de abordagem.

Tal qual na tentativa de remoção de bens históricos narrada quatro parágrafos acima, não se furtará o parquet federal a, sendo necessário, solicitar ao Judiciário que impeça ou corrija eventual lesão aos interesses públicos primários que o caso suscita. Daí porque, com o escopo máximo de se evitarem lides desnecessárias, que atravanquem o atendimento das demandas político-sociais, afigura-se conveniente recomendar-se aos atores do
pretendido negócio que não ignorem ou minimizem nenhuma das relevantes variáveis mencionadas nesta decisão, sob pena de embargo judicial imediato.

Nessa hipótese, não se poderá alegar que o Ministério Público ou a Justiça estão a impedir a consecução de anseios e projetos favoráveis à coletividade. Afinal, a própria Administração é que, tendo sido expressamente advertida, ter-se-á colocado em posição de dar causa a tal
impedimento. Aliás, essa proposição seria verdadeira ainda que recomendação não houvesse, pois é dever do administrador proceder com razoabilidade e proporcionalidade, independentemente de ser instado nesse sentido.

Diante do exposto, expeçam-se as recomendações que preparei ao MUNICÍPIO (chefia do Poder Executivo), ao MINISTÉRIO DOS TRANSPORTES e ao DNIT. Dê-se ciência ao representante, a cada um dos vereadores deste Município, à Secretaria da Cultura municipal e ao promotor de Justiça responsável pelas questões urbanísticas. Anualmente, renovem-se, com as necessárias
adaptações, as requisições de f. 90/93 e 94/97.

Ribeirão Preto, 18 de janeiro de 2012.

A segunda carta:

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
PROCURADORIA DA REPÚBLICA EM RIBEIRÃO PRETO (SP)
RECOMENDAÇÃO PRM/RP Nº 03/2012

Excelentíssima Senhora
DÁRCY VERA
Prefeita Municipal
Ribeirão Preto – SP

EMENTA: Ramais ferroviários em Ribeirão Preto. Antiga Companhia Mogyana. Plano da Administração municipal de eliminação ou de nova afetação desses ramais, após cessão das áreas pela União. Pretensão de instalação de corredor de ônibus. Ausência de embasamento técnico para o negócio. Riscos para o patrimônio histórico-cultural e para o erário municipal.

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, por intermédio, do Procurador da República que esta subscreve, no exercício de suas atribuições constitucionais e legais, com fundamento nos artigos 127 e 129, caput, III, da Constituição Federal, bem como no artigo 6º, caput, XX, da Lei Complementar nº 75/1993, segundo os quais deve expedir recomendações para preservação
de direitos por ele tutelados e:

CONSIDERANDO que o Ministério Público é instituição
permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a
defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e
individuais indisponíveis (CF, art. 127);

CONSIDERANDO que são funções institucionais do
Ministério Público zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos
serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição,
promovendo as medidas necessárias a sua garantia (CF, art. 129, caput, II);
bem como promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do
patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos,
coletivos e individuais indisponíveis (CF, art. 129, caput, III);

CONSIDERANDO que tramitam neste órgão ministerial as peças informativas nº 1.34.010.000323/2011-10, instauradas em razão de representação formulada pelo presidente do INSTITUTO HISTÓRIA DO TREM, entidade privada, sediada nesta cidade, vocacionada para a preservação da memória ferroviária;

CONSIDERANDO as fundadas razões contidas na decisão lançada nas folhas 180/185 de referido procedimento, datada de 18 de janeiro de 2012, que segue em anexo e constitui parte integrante e indissociável deste ato;

RESOLVE RECOMENDAR ao MUNICÍPIO DE RIBEIRÃO PRETO que não contrate com a UNIÃO, a título gratuito ou oneroso, a aquisição das áreas onde situados os ramais desativados da antiga Companhia Mogyana enquanto não houver cabal e aprofundado embasamento técnico sobre a utilidade desses bens para o MUNICÍPIO.

A presente recomendação é expedida nos autos do procedimento administrativo nº 1.34.010.000323/2011-10, de caráter público. Cópia de peças desses autos pode ser obtida, mediante recolhimento de taxa própria, na Procuradoria da República em Ribeirão Preto, situada na Rua Conde Afonso Celso nº 904, Sumaré, Ribeirão Preto (fone 16-3602-5700).

Ribeirão Preto, 18 de janeiro de 2012.

A terceira carta:

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
PROCURADORIA DA REPÚBLICA EM RIBEIRÃO PRETO (SP)
RECOMENDAÇÃO PRM/RP Nº 04/2012

Excelentíssimo Senhor
PAULO SÉRGIO OLIVEIRA PASSOS
Ministro dos Transportes
Brasília – DF
PRM-RAO/SP

EMENTA: Ramais ferroviários em Ribeirão Preto. Antiga Companhia Mogyana. Plano da Administraçãomunicipal de eliminação ou de nova afetação desses ramais, após cessão das áreas pela União. Pretensão de construção de novo ramal, a ser custeado pela
União. Ausência de embasamento técnico para o negócio (cessão) e para as obras (eliminação de
ramais antigos e construção de novo). Riscos para o patrimônio histórico-cultural e para o erário federal.

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, por intermédio, do Procurador da República que esta subscreve, no exercício de suas atribuições constitucionais e legais, com fundamento nos artigos 127 e 129, caput, III, da Constituição Federal, bem como no artigo 6º, caput, XX, da Lei Complementar nº 75/1993, segundo os quais deve expedir recomendações para preservação de direitos por ele tutelados e:

CONSIDERANDO que o Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (CF, art. 127);

CONSIDERANDO que são funções institucionais doMinistério Público zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia (CF, art. 129, caput, II); bem como promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis (CF, art. 129, caput, III);

CONSIDERANDO que tramitam neste órgão ministerial as peças informativas nº 1.34.010.000323/2011-10, instauradas em razão de representação formulada pelo presidente do INSTITUTO HISTÓRIA DO TREM, entidade privada, sediada nesta cidade, vocacionada para a preservação da memória ferroviária;

CONSIDERANDO as fundadas razões contidas na decisão lançada nas folhas 180/185 de referido procedimento, datada de 18 de janeiro de 2012, que segue em anexo e constitui parte integrante deste ato;

RESOLVE RECOMENDAR ao MINISTÉRIO DOS TRANSPORTES

(i) que não aprove a cessão ao MUNICÍPIO DE RIBEIRÃO PRETO, a título gratuito ou oneroso, das áreas onde situados os ramais desativados da antiga Companhia Mogyana enquanto não houver cabal e aprofundado embasamento técnico sobre a impossibilidade de aproveitamento de tais ramais e (ii) que não aprove a construção de um novo ramal em substituição aos já existentes enquanto não houver cabal e aprofundado embasamento técnico sobre a necessidade dessa obra.

A presente recomendação é expedida nos autos do procedimento administrativo nº 1.34.010.000323/2011-10, de caráter público. Cópia de peças desses autos pode ser obtida, mediante recolhimento de taxa própria, na Procuradoria da República em Ribeirão Preto, situada na Rua Conde Afonso Celso nº 904, Sumaré, Ribeirão Preto (fone 16-3602-5700).

Ribeirão Preto, 18 de janeiro de 2012.

A quarta e última carta:

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
PROCURADORIA DA REPÚBLICA EM RIBEIRÃO PRETO (SP)
RECOMENDAÇÃO PRM/RP Nº 05/2012

EMENTA: Ramais ferroviários em Ribeirão Preto. Antiga Companhia Mogyana. Plano da Administração municipal de eliminação ou de nova afetação desses ramais, após cessão das áreas pela União. Pretensão de construção de novo ramal, a ser custeado pela
União. Ausência de embasamento técnico para o negócio (cessão) e para as obras (eliminação de ramais antigos e construção de novo). Riscos para o patrimônio histórico-cultural e para o erário federal.

Ilustríssimo Senhor
JORGE ERNESTO PINTO FRAXE
Diretor-Geral do DNIT
Ministério dos Transportes
Brasília – DF
PRM-RAO/SP

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, por intermédio, do Procurador da República que esta subscreve, no exercício de suas atribuições constitucionais e legais, com fundamento nos artigos 127 e 129, caput, III, da Constituição Federal, bem como no artigo 6º, caput, XX, da Lei Complementar nº 75/1993, segundo os quais deve expedir recomendações para preservação de
direitos por ele tutelados e:

CONSIDERANDO que o Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (CF, art. 127);

CONSIDERANDO que são funções institucionais do Ministério Público zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia (CF, art. 129, caput, II); bem como promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis (CF, art. 129, caput, III);

CONSIDERANDO que tramitam neste órgão ministerial as peças informativas nº 1.34.010.000323/2011-10, instauradas em razão de representação formulada pelo presidente do INSTITUTO HISTÓRIA DO TREM, entidade privada, sediada nesta cidade, vocacionada para a preservação da memória ferroviária;

CONSIDERANDO as fundadas razões contidas na decisão lançada nas folhas 180/185 de referido procedimento, datada de 18 de janeiro de 2012, que segue em anexo e constitui parte integrante deste ato;

RESOLVE RECOMENDAR ao DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRAESTRUTURA DE TRANSPORTES – DNIT
(i) que não aprove a cessão ao MUNICÍPIO DE RIBEIRÃO PRETO, a título gratuito ou
oneroso, das áreas onde situados os ramais desativados da antiga Companhia Mogyana enquanto não houver cabal e aprofundado embasamento técnico sobre a impossibilidade de aproveitamento de tais ramais e

(ii) que não aprove a construção de um novo ramal em substituição aos já existentes enquanto não houver cabal e aprofundado embasamento técnico sobre a necessidade dessa
obra.

A presente recomendação é expedida nos autos do procedimento administrativo nº 1.34.010.000323/2011-10, de caráter público.

Cópia de peças desses autos pode ser obtida, mediante recolhimento de taxa própria, na Procuradoria da República em Ribeirão Preto, situada na Rua Conde Afonso Celso nº 904, Sumaré, Ribeirão Preto (fone 16-3602-5700).

Ribeirão Preto, 18 de janeiro de 2012.

domingo, 5 de fevereiro de 2012

A RUA BARÃO DE ITAPETININGA VOLTA A SER BONITA

Prédio de 4 andares construído possivelmente nos anos 1910 ou 1920, na esquina com a rua Dom José de Barros.

Nos últimos tempos, com a expulsão dos camelôs que haviam tomado conta do centro da cidade de São Paulo, diversas ruas do Centro Velho (Lado "de lá" do Anhangabaú) e do Centro Novo (Lado "de cá" do Anhangabaú) passaram a ser mais limpas e terem melhor manutenção.

A rua Barão de Itapetininga, que liga o viaduto do Chá à praça da República, livre de tanto bagulho que atrapalhava o movimento dos pedestres, manteve o seu calçadão e agora é um amplo passeio.
Fachada térrea do belo Edifício "Casa Guatapará"

Com poucos edifícios altos - a grande maioria não passa de oito andares e existem ainda alguns bem baixos - a rua é bastante charmosa. Muitas lojas, auxiliadas pelo fato de não poderem mais colocar os enormes nomes e anúncios de liquidações (com a chegada da lei Cidade Limpa, única coisa realmente séria e boa que o prefeito Kassab fez), ficam geralmente no térreo dos prédios.
Edifício de onde saíram os tiros no dia do MMDC, na esquina da Prça da República. Fotografia de 1932

Até 1892, a rua começava onde hoje é a praça do Patriarca, descendo e subindo o vale. Nesse ano, ficou pronto o primeiro viaduto do Chá e a rua passou a se iniciar na praça Ramos de Azevedo, que surgiu mesmo com a inauguração do teatro Municipal em 1911.
No início da rua, a preça Ramos de Azevedo, com o Teatro Municipal. Lá atrás, meio escondido atrás do poste, o hoje "baixinho" Palacete Sampaio Moreira

O nome da rua foi dado pelo fato de ela terminar no palacete do Barão de Itapetininga. No final do século XIX, o palacete passou a ser do Barão de Tatuí e somente foi demolido nos primeiros anos da década de 1910, para a construção do Palacete Prates, na esquina da rua Líbero Badaró com o viaduto.
O Cinema Universal, na rua Barão de Itapetininga, em foto de 1916. Onde teria sido?

Também no início do século XX, havia na rua alguns cinemas e também oficinas de automóveis. São poucas, no entanto, as fotografias de prédios e edificações na rua.
O mesmo prédio do MMDC, em foto tirada hoje. Sacado da Praça da República

Na esquina da Praça da República, ainda existe o prédio de onde saíram os tiros que mataram Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo em 1932 e foram o estopim da revolução Constitucionalista, ainda está lá.
À esquerda, o belo edifício de 3 andares da antiga Confeitaria Vienense. Para o fundo a rua Barão de Itapetininga, sentido viaduto do Chá

A Confeitaria Vienense, outrora chique e muito boa, decaiu e depois fcehou, embora o prédio ainda exista ali.

sábado, 4 de fevereiro de 2012

CONFISSÕES DE UM RANHETA

Quantos saquinhos v. vê aqui?

Na história dos saquinhos plásticos descartáveis dos supermercados, quem faz o papel de palhaço é você - ou melhor, todos nós, com exceção, claro, dos familiares dos donos de supermercados e dos fabricantes de sacos plásticos para lixo.

Tomaram uma decisão baseada nos poetas e sabichões que acham que a "ecologia" vai salvar o mundo e ferraram com um monte de gente que faz compras em supermercados. Bom, tem alguém que não faça?

Ora, vamos (eles, os supermercados) deixar de dar sacolinhas grátis (economizando um valor avaliado em no mínimo 200 milhões de reais), enquanto você entra com o dinheiro: passa a comprar sacolas biodegradáveis (em teoria - já viu alguma se biodegradar? Não, por que demora tempo "pra burro").

Não quer comprar sacolas? É desaforo, não é? O lucro dos supermercados aumentou bastante e mais ainda por vender essas porcarias, e você que pague. Alternativas? Peça uma caixa - que geralmente não tem, pois todos as querem e não há caixa que chegue. A maioria das caixas está rasgada ou é fraca demais para o peso das mercadorias. Além do mais, já tem espertinho dizendo que "com caixas usadas há o perigo de contaminação dos produtos comprados. A desculpa vai aumentar cada vez mais e eles não pararão de ceder caixas para "ajudar a sua saúde".

Bom, com poucas caixas, você vai ter de trazer sacos, cestas e carrinhos de feira da sua casa. Claro, se você lembrar. Mas, muitas vezes, você está voltando do serviço ou de qualquer outro lugar e decide ir a um supermercado fazer compras. E não tem nada disso no carro. O que fazer? Jogar as mercadorias na mala do carro depois da compra ou comprar os belos saquinhos "ecológicos".

Ah, não é lei! Fizeram um "acordo" para salvar o mundo! É mesmo? Ninguém me chamou para essa reunião. Claro, eles não chamam os palhaços e trouxas para reuniões. Eles quem? Os supermercados, claro! Ah, mas em Jundiaí, eles fizeram um teste de sei lá quantos meses sem saquinhos e "a população aprovou". Mesmo? Será que em Jundiaí somente tem palhaços?

Bom, aqui na Grande São Paulo, nas duas vezes que fui a supermercados depois da "lei Áurea", discuti com funcionários por causa disso. Eles dizem que "foram ordens de cima" e "que nada podem fazer", mas, naquele momento, eles representam a empresa. Então, têm de ouvir mesmo! Os franceses daquele lixo do Carrefour e o arrogante sr. Diniz não vão querer ouvir nossas "baixarias". Fora os Srs. Wal-Mart e Dias da vida.

No jornal de hoje, anuncia-se que "adiaram o acordo por 2 meses" pois "havia reclamações de clientes que não tinham onde carregar as mercadorias". Puxa! A coisa deve ter sido grave, para terem suspendido provisoriamente o acordo.

(Perguntar não ofende: e as garrafas pet???????)

Que tal chamarem a população para a reunião de discussão do tal acordo? Não adianta chamar ecochato. Estes são poetas - não estão no mundo real. Eu passei a vida inteira economizando papel para usar novamente, idem com plásticos, e ninguém me ensinou isso. Não jogo lixo fora de uma lata de lixo nem a paulada. Colaborei sempre com coletas seletivas. Agora, porém, a vontade que tenho é de recolher todo o lixo da minha casa todos os dias e jogar no Tietê - que, por acaso, fica a 500 metros apenas da minha casa. Chega de ecologia. Ecologia é para poetas... e palhaços.

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

AVACALHAÇÃO NAS FERROVIAS BRASILEIRAS

Americana, 2009 - Foto André B. Benetti

O artigo abaixo foi-me enviado hoje pelo engenheiro Paulo Ferraz, do Paraná. Não sei a fonte, mas foi aparentemente publicado hoje em algum jornal e/ou site de notícias. Como sempre, nada no Brasil é feito de forma séria. Leiam:

É OBRIGATÓRIA A MANUTENÇÃO DO SERVIÇO PÚBLICO CONCEDIDO EM TODOS OS
TRECHOS FERROVIÁRIOS

Segundo o artigo 175 da Constituição Federal, “incumbe ao Poder Público, na
forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre
através de licitação, a prestação de serviços públicos”. E continua
“Parágrafo único. A lei disporá sobre: I - o regime das empresas
concessionárias e permissionárias de serviços públicos, o caráter especial
de seu contrato e de sua prorrogação, bem como as condições de caducidade,
fiscalização e rescisão da concessão ou permissão; II - os direitos dos
usuários; III - política tarifária; IV - *a obrigação de manter serviço
adequado*.

Conforme o § 1º do artigo 6º da Lei nº 8.987/95, que dispõe sobre o regime
de concessão da prestação de serviços públicos, e que regulamentou o artigo
175 da Constituição Federal, estabeleceu que o serviço público adequado “é
o que satisfaz as condições de* regularidade, continuidade*, eficiência,
segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade
das tarifas”.

Em março de 2009 o Diretor Geral da ANTT concedeu entrevista a Revista
Ferroviária admitindo na ocasião que dois terços da malha ferroviária
concedida a empresas privadas já estavam subutilizadas, ou seja o serviço
público concedido de transporte ferroviário de cargas já não estava sendo
prestado pelas concessionárias de forma adequada, pois não era regular e
contínuo.

Na época, segundo o Relatório da Auditoria Interna da ANTT nº
02/OA/AUDIT/2009, referente à auditoria realizada de 02/03/09 a 31/03/2009
na Unidade Regional do Rio Grande do Sul da ANTT, a concessionária da Malha
Sul da ex-Rede Ferroviária Federal, a America Latina Logística Malha Sul,
por exemplo, já não realizava a prestação de serviços públicos concedidos
em 1.996 quilômetros de ferrovia concedida para a empresa, de um total de
6.913 quilômetros da Malha Sul, ou seja, em 28,44% da malha ferroviária sul
a concessionária já havia desativado todo o transporte ferroviário.

Abaixo as tabelas com os trechos desativados extraídas do Relatório da
Auditoria Interna da ANTT nº 02/OA/AUDIT/2009: (nota minha: esta tabela não veio na mensagem).

Um exemplo do abandono da ferrovia pela Concessionária são os 80
quilômetros que ligam São Borja até Unistalda, no Rio Grande do Sul, onde
não existe mais a linha ferroviária. Os dormentes, os trilhos e até as
pedras do lastro de linha sumiram. O pátio da estação de São Borja foi
totalmente invadido pelas populações de baixa renda.

A Resolução da ANTT nº 44 de 04 de julho de 2002 estabelece diversos
procedimentos relativos às solicitações de suspensão e supressão de
serviços de transporte ferroviário e de desativação de trechos, pelas
concessionárias de serviço público de transporte ferroviário, com
fundamento no art. 6º da Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, nos
arts. 3º e 4º do Regulamento dos Transportes Ferroviários, aprovado pelo
Decreto nº 1.832, de 4 de março de 1996, e nos contratos de concessão.

As Concessionárias ferroviárias entretanto vem ao longo dos quinze anos de
concessão, realizando a suspensão e supressão de serviços de transporte
ferroviário e a desativação de trechos por iniciativa própria e sem cumprir
quaisquer procedimentos legais.

A ausência da prestação de serviço público de transporte ferroviário de
carga, entretanto já tinha sido identificada como uma irregularidade por
outros órgãos públicos, inclusive pelo Juiz Federal Mauro Spalding, de
Jacarezinho/PR, conforme a sentença emitida em 31 de outubro de 2007,
refente a Ação Civil Pública nº 2006.70.13.001025-3/PR, que trata do
abandono das ferrovias pelos entes privados.

Na sentença, Mauro Spalding afirma que “não se pode olvidar que nos
contratos de concessão a continuidade da prestação dos serviços é princípio
fundamental norteador da aplicação das avenças pactuadas pelo Poder Público
com o particular-concessionário. Com efeito, o Estado transfere ao
particular o exercício do serviço público, continuando na titularidade do
referido serviço, motivo pelo qual o concessionário deve respeitar as
condições estabelecidas em lei e no contrato de concessão”.

Com base nisso, Mauro Spalding concluiu: “é evidente, pela dicção legal,
que o concessionário não pode furtar-se de manter em funcionamento o
serviço público, dentro dos padrões de segurança, eficiência e conservação”.

Com referência ao estabelecido nos contratos de concessão das malhas
ferroviárias, estão previstas várias obrigações para as concessionárias,
tais como: prestar serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários,
assegurar a prestação de serviço adequado e manter a continuidade do
serviço concedido.

O contrato de concessão também prevê que é direito dos usuários receber
serviço adequado.

No caso do descumprimento das obrigações previstas, o contrato prevê que a
concessionária deve ser multada pela agência fiscalizadora, a Agência
Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), podendo o valor da multa
alcançar o valor de quase 500 mil reais para cada ocasião em que se
constatar o descumprimento da obrigação. Isto mostra que o contrato de
concessão tem possibilidades de penalização da concessionária, capaz de
fomentar a manutenção dos serviços de transporte de cargas.

O descumprimento do contrato compromete até mesmo a lisura do processo
licitatório, pois sem o cumprimento das obrigações previstas, o lance que
arrematou o leilão poderia ter sido muito maior.

Na mesma sentença, Mauro Spalding afirma que “a documentação juntada pelo
MPF - particularmente as fotografias de fls. 209/243 - demonstram a
ineficiência da atuação da ANTT em seu papel de fiscal”.

Pela lei a ANTT deve fiscalizar e exigir que as concessionárias
ferroviárias cumpram o contrato de concessão que nada mais é que uma
transcrição do edital de licitação que norteou a disputa das várias
empresas privadas pelo direito de prestar o serviço público em nome do
Estado brasileiro. É missão institucional da ANTT assegurar aos usuários a
adequada prestação de serviços de transporte terrestre e exploração de
infraestrutura rodoviária e ferroviária outorgada.

Aliás, tal premissa genérica foi instituída com a publicação da Lei nº
10.233/2001, que reestruturou os transportes aquaviários e terrestres,
criando o Conselho Nacional de Integração de Políticas de Transporte, a
Agência Nacional de Transportes Terrestres – ANTT, a Agência Nacional de
Transportes Aquaviários – ANTAQ – e o Departamento Nacional de
Infraestrutura de Transportes – DNIT.

A ANTT é responsável, além de outras determinações, pela fiscalização
direta do cumprimento das cláusulas contratuais de prestação de serviços
ferroviários e de manutenção e reposição dos ativos arrendados (inc. IV),
além de contribuir para a preservação do patrimônio histórico e da memória
das ferrovias, orientando e estimulando a participação dos concessionários
do setor (inc. VII).

A responsabilidade é da Diretoria, sobretudo do Diretor-Geral, a quem cabe
a representação da ANTT e o comando hierárquico sobre pessoal e serviços
(art. 26, da Resolução nº 001/2002).

Segundo o Ministério Público Federal, entretanto, conforme a representação
feita junto ao TCU, a ANTT não tem cumprido seu papel como ente regulador.

Segundo o MPF, “é visível a postura leniente da direção da Agência, que tem
evitado a aplicação de qualquer penalidade à América Latina Logística S/A.
O trabalho de seus próprios administrados é dificultado. Assim, infringem
claramente as Resoluções que tratam especificamente do Auto de Infração”.

Segundo contrato de concessão e o art. 21 do regulamento anexo à Resolução
nº 442/2004 da própria ANTT, “o auto de infração será lavrado no momento em
que verificada a prática da infração”. Segundo o MPF, entretanto, a ANTT
não autoriza seus agentes a emitirem diretamente Autos de Infração. Os
funcionários são instruídos a emitirem apenas e tão somente relatórios
sobre as Inspeções Técnicas realizadas, conforme se a Ordem de Serviço
estabelecida no Memorando Circular nº 18/SUCAR, de 27 de janeiro de 2010. A
determinação da Ordem de Serviço é: “Em caso de problema grave, em que haja
proposta de aplicação de penalidade à Concessionária, deverá ser elaborada
Nota Técnica e enviada à GEFER junto ao relatório.

É flagrante a irregularidade e ilegalidade na determinação feita pela ANTT
aos seus servidores, favorecendo as concessionárias ferroviárias, uma vez
que as mesmas não são penalizadas com as pesadas multas prevista nos
contratos de concessão, configurando um total descompasso com a legislação
vigente que determina que os Técnicos devem lavrar autos de infração no
local que verifica a irregularidade.

Dessa forma, o Governo Federal vem pagando bons salários aos técnicos da
ANTT, mas impedindo que eles trabalhem em favor dos interesses do país.

Tais fatos confirmam por que a ANTT permite que as concessionárias
literalmente abandonem trechos ferroviários, permitindo o sucateamento e a
destruição de bens públicos sem tomar as providências que determina a
legislação e proibindo que os técnicos em regulação assim o façam.

As concessionárias desoneram-se do ônus contratual da manutenção e
conservação de aproximadamente 2/3 da malha ferroviária brasileira;
desoneram-se, também, da obrigação contratual de oferecer serviço público
de transporte de cargas aos usuários; descumprem elas, como determina a lei
de concessões, a obrigação de assegurar a continuidade do serviço público.
Dito de outro modo, minimizam custos em detrimento/prejuízo do patrimônio
público e do desenvolvimento nacional e sobretudo regional.

Embora não tenha providenciado a penalização das infrações contratuais
durante os 15 anos de concessão, a diretoria da ANTT reconheceu pelos menos
o dever contratual das Concessionárias de zelar pelos bens vinculados à
concessão, mantendo-os em perfeitas condições de funcionamento e
conservação, através da Deliberação ANTT N.o 124, de 6 de julho de 2011.

Nesta Deliberação a Diretoria da ANTT determinou as concessionárias
condições e prazos para regularizar a situação dos 5.544 km de trechos e
ramais ferroviários sem tráfego de cargas, de forma a adequá-los para o
transporte de cargas, no mínimo nas mesmas condições previstas quando da
celebração dos respectivos Contratos de Concessão e de Arrendamento.

Os trechos citados na Deliberação são:

I - Trecho: Pradópolis - Barretos; Extensão: 131 km; Concessionária: ALL
Malha Paulista;

II - Trecho: Bauru - Tupã; Extensão: 172 km; Concessionária: ALL Malha
Paulista;

III - Trecho: Tupã - Adamantina; Extensão: 72 km; Concessionária: ALL Malha
Paulista;

IV - Trecho: Adamantina - Panorama; Extensão: 155 km; Concessionária: ALL
Malha Paulista;

V - Ramal de Piracicaba; Extensão: 45 km; Concessionária: ALL Malha
Paulista;

VI - Trecho: Maringá - Cianorte; Extensão: 92 km; Concessionária: ALL Malha
Sul;

VII - Trecho: Santo Ângelo - Cerro Largo - São Luiz Gonzaga; Extensão: 106
km; Concessionária: ALL Malha Sul;

VIII - Trecho: Santiago - Dilermando Aguiar; Extensão: 142 km;
Concessionária: ALL Malha Sul;

IX - Trecho: Entroncamento - Livramento; Extensão: 156 km; Concessionária:
ALL Malha Sul;

X - Trecho: Presidente Epitácio - Presidente Prudente; Extensão: 104 km;
Concessionária: ALL Malha Sul;

XI - Trecho: Morretes - Antonina; Extensão: 16 km; Concessionária: ALL
Malha Sul;

XII - Trecho: Cabo - Propriá; Extensão: 549 km; Concessionária:
Transnordestina Logística;

XIII - Trecho: Ribeirão Preto - Passagem; Extensão: 63 km; Concessionária:
Ferrovia Centro-Atlântica;

XIV - Trecho: São Francisco - Propriá; Extensão: 431 km; Concessionária:
Ferrovia Centro-Atlântica;

XV - Trecho: Paripe - Mapele; Extensão: 8 km; Concessionária: Ferrovia
Centro-Atlântica;

XVI - Ramal de Ladário; Extensão: 5 km; Concessionária: ALL Malha Oeste;

XVII - Trecho: Santiago - São Borja; Extensão: 160 km; Concessionária: ALL
Malha Sul;

XVIII - Trecho: Varginha - Evangelista de Souza; Extensão: 21 km;
Concessionária: ALL Malha Paulista;

XIX - Trecho: Indubrasil - Ponta Porã; Extensão: 304 km; Concessionária:
ALL Malha Oeste;

XX - Trecho: Barão de Camargos - Lafaiete Bandeira; Extensão: 334 km;
Concessionária: Ferrovia Centro-Atlântica;

XXI - Trecho: Cavaru - Ambaí; Extensão: 143 km; Concessionária: Ferrovia
Centro-Atlântica;

XXII - Trecho: Salgueiro - Jorge Lins; Extensão: 595 km; Concessionária:
Transnordestina Logística;

XXIII - Trecho: Paula Cavalcante - Macau; Extensão: 479 km; Concessionária:
Transnordestina Logística;

XXIV - Trecho: Ambaí - Santo Bento; Extensão: 18 km; Concessionária:
Ferrovia Centro-Atlântica;

XXV - Trecho: Marques dos Reis - Jaguariaíva; Extensão: 210 km;
Concessionária: ALL Malha Sul;

XXVI - Trecho: Passo Fundo - Cruz Alta; Extensão: 194 km; Concessionária:
ALL Malha Sul;

XXVII - Trecho: Mafra - Porto União; Extensão: 242 km; Concessionária: ALL
Malha Sul;

XXVIII - Trecho: Porto União - Passo Fundo; Extensão: 173 km;
Concessionária: ALL Malha Sul;

XXIX - Trecho: São Luiz Gonzaga - Santiago; Extensão: 115 km;
Concessionária: ALL Malha Sul;

XXX - Ramal de Cachoeira do Sul; Extensão: 6 km; Concessionária: ALL Malha
Sul;

XXXI - Trecho: Biagipólis - Itaú; Extensão: 165 km; Concessionária:
Ferrovia Centro-Atlântica;

XXXII - Trecho: General Carneiro - Miguel Burnier; Extensão: 84 km;
Concessionária: Ferrovia Centro-Atlântica;

XXXIII - Trecho: Barretos - Colômbia; Extensão: 54 km; Concessionária: ALL
Malha Paulista.

A malha ferroviária no país atualmente é de 28,2 mil quilômetros. Os
Estados Unidos têm 270 mil quilômetros de ferrovias, e a China, 90 mil.
Segundo o diretor-executivo da ANTF (Associação Nacional dos
Transportadores Ferroviários), Rodrigo Vilaça, em entrevista à Folha.com em
22/02/2011, o Brasil deveria ter atualmente 52 mil quilômetros de ferrovias
para atender à demanda de transporte, sobretudo de minérios e de grãos.

Por tudo isso não se pode entender como o Governo Federal abriu mão de mais
de 5.000 km de ferrovia que foram sucateadas e não estão sendo usadas.



*ANEXOS – EXTRATO DOS DOCUMENTOS EXAMINADOS*

* *

*ENTREVISTA DE BERNARDO FIGUEIREDO A REVISTA FERROVIÁRIA EM MARÇO DE 2009*

RF: Quantos quilômetros da malha brasileira estão hoje subutilizados? Cinco
mil, sete mil?

Bernardo - Eu acho que é mais do que isso.

RF: Mais?

Bernardo - Dois terços da malha ferroviária brasileira estão subutilizados.
E o critério que eu uso para chegar a essa definição é o seguinte: uma
ferrovia em que não passa pelo menos um trem por dia está subutilizada, não
é?



*DELIBERAÇÃO ANTT N.o 124, DE 6 DE JULHO DE 2011*

CONSIDERANDO o dever contratual das Concessionárias de zelar pelos bens
vinculados à concessão, mantendo-os em perfeitas condições de funcionamento
e conservação, delibera estabelecer condições e fixar prazos para
regularizar a situação de 5.544 km de trechos e ramais ferroviários sem
tráfego de cargas, de forma a adequá-los para o transporte de cargas, no
mínimo nas mesmas condições previstas quando da celebração dos respectivos
Contratos de Concessão e de Arrendamento.

*CONTRATOS DE CONCESSÃO *

*CLAUSULA NONA: DAS OBRIGAÇÕES DAS PARTES*

*ITEM 9.1 – DAS OBRIGAÇÕES DA CONCESSIONÁRIA*

*VIII) Prestar serviço adequado *ao pleno atendimento dos usuários, sem
qualquer tipo de discriminação e sem incorrer em abuso de poder econômico,
atendendo às condições de regularidade, continuidade, eficiência,
segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade
das tarifas.

X) Promover a reposição de bens e equipamentos vinculados à CONCESSÃO, bem
como a aquisição de novos bens,* de forma a assegurar prestação de serviço
adequado.*

XIV) Zelar pela integridade dos bens vinculados à CONCESSÃO, conforme
normas técnicas específicas, mantendo-os em perfeitas condições de
funcionamento e conservação, até a sua transferência à CONCEDENTE ou à nova
CONCESSIONÁRIA.

*XXIV) Manter a continuidade do serviço concedido*, salvo interrupção
emergencial causada por caso fortuito ou força maior, comunicando
imediatamente a ocorrência de tais fatos à CONCEDENTE.

CLAUSULA DÉCIMA-PRIMEIRA – DOS DIREITOS E OBRIGAÇÕES DOS USUÁRIOS

São direitos e obrigações dos usuários:

*I) Receber serviço adequado; *

CLAUSULA DÉCIMA-TERCEIRA – DAS INFRAÇÕES E PENALIDADES

Parágrafo 15º - A concessionária será multada quando infringir qualquer das
obrigações do Grupo III, descrito a seguir:

- incisos XIX a XXI, XXIV a XXVI do item 9.1 da clausula nona.

Parágrafo 18º - O valor básico unitário da multa será equivalente ao da
maior parcela fixa dentre as tarifas de referência homologadas para a malha
expressa em reais por tonelada. Ficam estabelecidos os seguintes valores de
multa:

Grupo II: 10.000 (dez mil) vezes o valor básico unitário;

*Grupo III: 30.000 (trinta mil) vezes o valor básico unitário.*

(OBS: valor básico unitário aproximado de R$ 16,00)

*SENTENÇA DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA Nº 2006.70.13.001025-3/PR*

*JUSTIÇA FEDERAL*

* A concessão é instituto que representa crucial importância
para a prestação dos serviços públicos à população. Nesse contexto, não se
pode olvidar que nos contratos de concessão a continuidade da prestação dos
serviços é princípio fundamental norteador da aplicação das avenças
pactuadas pelo Poder Público com o particular-concessionário. Com efeito, o
Estado transfere ao particular o exercício do serviço público, continuando
na titularidade do referido serviço, motivo pelo qual o concessionário deve
respeitar as condições estabelecidas em lei e no contrato de concessão.*

Não obstante, a Lei nº 8.987/95, que regulamentou o artigo 175 da
Constituição Federal, estabelece:

"Art. 6º (...)

§ 1º - Serviço adequado é o que satisfaz as condições de
regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade,
generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas.

§ 2º - A atualidade compreende a modernidade das técnicas, do
equipamento e das instalações e a sua conservação, bem como a melhoria e
expansão do serviço.

É evidente, pela dicção legal, que o concessionário não pode
furtar-se de manter em funcionamento o serviço público, dentro dos padrões
de segurança, eficiência e conservação.

*Neste passo, revela-se descabida a alegação da ANTT de que teria cumprido
seu mister. A farta documentação juntada comprova, de fato, o trâmite de
procedimentos administrativos com imposição de penalidades. Mas a
documentação juntada pelo MPF - particularmente as fotografias de fls.
209/243 - demonstram a ineficiência da atuação da ANTT em seu papel de
fiscal.*

*REPRESENTAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL CONTRA A ANTT JUNTO AO
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO*

É visível a postura leniente da direção da Agência, que tem evitado a
aplicação de qualquer penalidade à América Latina Logística S/A. O trabalho
de seus próprios administrados é dificultado. Assim, infringem claramente
as Resoluções que tratam especificamente do Auto de Infração.

O art. 21 do regulamento anexo à Resolução nº 442/2004 dispõe que “O auto
de infração será lavrado no momento em que verificada a prática da
infração, seja em flagrante seja no curso de procedimento de fiscalização”
(grifou-se), e prevê a seguinte exceção: “Salvo motivo de força maior,
devidamente justificado, nos casos de flagrante e de fiscalização, o auto
de infração será lavrado no local em que verificada a falta, ainda que o
infrator não seja estabelecido ou domiciliado no local” (§ 1º, art. 21),
bem como que o Autor de Infração (AI) deverá obedecer os modelos aprovados
pelas Superintendências de Processos organizacionais competentes, sendo
numerado e lavrado com observância da sequência numérica do talonário (art.
22).

Ou seja, a regra é de que o agente fiscalizador deverá lavrar o Auto de
Infração no momento em que constatar a prática infratora, e a exceção se
refere à possibilidade de o fazer em momento posterior, desde que
devidamente justificada.

Por seu turno, os termos do art. 2º da Resolução nº 442/2004 determinam que
“a autoridade que tiver ciência de infrações legais ou contratuais, ou de
indícios de sua prática, é obrigada a promover a sua apuração imediata,
mediante instauração de procedimento de averiguações preliminares ou de
processo administrativo, assegurados, nesta hipótese, o contraditório e a
ampla defesa”. No entanto, conforme exposto na reunião do dia 22/04/2011 na
sede da ANTT, pelo Grupo de Trabalho Transportes da Terceira Câmara de
Coordenação e Revisão – Consumidor e Ordem Econômica, da Procuradoria Geral
da República, informações dão conta de que a ANTT não vem lavrando Autos de
Infração no momento da constatação da infringência contratual pela
concessionária ferroviária, em alguns casos nunca os lavrando, e em outros
só o fazendo após a instauração de procedimento administrativo,
contrariando as normas editadas pela própria Agência.

A ANTT não autoriza seus agentes a emitirem diretamente Autos de Infração.
Os funcionários são instruídos a emitirem apenas e tão somente relatórios
sobre as Inspeções Técnicas realizadas. Essa tema foi objeto de recente
RECOMENDAÇÃO expedida pelo Grupo de Trabalho responsável também pela
elaboração deste documento, que segue em anexo.

Tais comandos partiram do Memorando Circular nº 18/SUCAR, de 27 de janeiro
de 2010. Uma das determinações da Superintendência é de que:

“Em caso de problema grave, em que haja proposta de aplicação de penalidade
à Concessionária, deverá ser elaborada Nota Técnica e enviada à GEFER junto
ao relatório (...)” (grifou-se).

Como se vê, determinou-se que sejam emitidos relatórios, que deverão ser
acompanhados de Notas Técnicas, e jamais lavrados Autos de Infração.

A assertiva acima poderá ser confirmada nos autos do processo
Administrativo nº 50520.006968/2010-29, aberto em virtude de recomendação
de aplicação de penalidades por especialistas da área.

É flagrante a irregularidade/ilegalidade na determinação da SUCAR, que
proíbe a emissão de Autos de Infração por Especialistas em Regulação da
ANTT em desfavor das concessionárias ferroviárias, em descompasso com a
legislação vigente que autoriza os Especialistas em Regulação de Serviços
de Transportes Terrestres e Técnicos em Regulação de Serviços de
Transportes Terrestres (Lei nº 10.871/2004) a lavrarem tal infração.

Tais fatos confirmam que o Poder Concedente permite que as concessionárias
literalmente abandonem trechos ferroviários, permitindo o sucateamento e a
destruição de bens públicos sem tomar as providências que determina a
legislação e proibindo que os técnicos em regulação assim o façam.

As concessionárias desoneram-se do ônus contratual da manutenção e
conservação de aproximadamente 2/3 da malha ferroviária brasileira;
desoneram-se, também, da obrigação contratual de oferecer serviço público
de transporte de cargas aos usuários; descumprem elas, como determina a lei
de concessões, a obrigação de assegurar a continuidade do serviço público.

Dito de outro modo, minimizam custos em detrimento/prejuízo do patrimônio
público e do desenvolvimento nacional e sobretudo regional.