quinta-feira, 8 de julho de 2010

O "MONGE" DE CAIEIRAS

Visitantes na fábrica de papel da Melhoramentos, em 1914 - território parnaibano.

O que hoje é o município de Caieiras, norte da Grande São Paulo, era, em 1925, uma "área cinzenta". A oeste do rio Juqueri, pertencia a Parnaíba (atual Santana de Parnaíba). A leste, a Juqueri (atual Mairiporã). O local se chamava Caieiras por causa da construção de uma estação ferroviária ali com esse nome em 1883, à margem leste do Juqueri, portanto no município que levava o nome do rio. Em volta da estação, formou-se uma vila, que hoje é o centro do município de Caieiras; do outro lado era terra da Companhia Melhoramentos, "área cinzenta" onde a Melhoramentos mandava mais do que a prefeitura de Parnaíba.

A polícia desta cidade tinha dificuldades de acompanhar os delitos que se praticava naquela área; as estradas que levavam para lá eram péssimas e o relevo não ajudava. Era mais fácil, porém igualmente demorado, ir até a estação de Barueri, na Sorocabana, tomar o trem para a estação central em São Paulo, dali seguir para a Luz e tomar o trem da Ingleza para Caieiras, e dali entrar de volta em terras do município. Em 1925, a situação era como a descrita.

Eis que aparece em Cayeiras, no km 32, um senhor de nome Misael, dedicado à profissão de "curandeiro-espiritista", que abusava da boa fé e ingenuidade dos moradores do local, chegando a construir uma casa à custa deles, com promessas de bênçãos etc. Ocorre que ele tratou de uma estudante de 18 anos do Grupo Escolar local, por homeopatia e alopatia, e a moça morreu, tendo sido sepultada sem atestado medico e formalidades legais. A polícia de Parnaíba foi avisada e foi investigar. Descobriu que Misael também se dava ares de profeta, espalhando pela plebe ignara que "o General Isidoro em breve estará em São Paulo e será o salvador da República". Sim, o general Isidoro Dias Lopes, que havia meio ano tinha sido um dos rebeldes que invadiram a capital de São Paulo na revolução de 1924 e teve forte apoio do povo mais simples.

Com dificuldade para chegar ao local, a polícia foi ajudada pelo pessoal da Melhoramentos, que conheciam bem o "curandeiro". A empresa relatou por escrito à delegacia parnaibana que "de boa vontade damos as informações a respeito do caso. Existe de fato no lugar indicado na denúncia esse curandeiro que se diz espírita, fazendo reuniões aos sábados à noite, com grande concorrência de adeptos, gente muito ignorante. É fato que o referido espírita conseguiu que lhe dessem terreno e que lhe construíssem uma casa a troco de promessas de coisas impossíveis. Esse falso espírita cobra a seus irmãos uma certa quantia em dinheiro, mensalmente, do qual consta que dá recibo; essa importância foi ultimamente aumentada para 5$000, em virtude da carestia da vida. O referido curandeiro chama-se Misael Rocha, ex-telegrafista da Companhia Sorocabana. Esse senhor já foi proibido de entrar nas propriedades da Companhia Melhoramentos, onde tem o seu maior número de adeptos, e onde tem feito maior número de vítimas, isso devido em grande parte à facilidade com que consegue em São Paulo o atestado médico para o sepultamento".

Havia pelo menos mais um curandeiro na região, um tal Antonio de Carvalho. Enquanto o povo gostava deles, já a Melhoramentos queria-os longe dali. Quanto à delegacia parnaibana, cada vez mais se queixava da dificuldade em policiar e atingir aquela região para investigações. Tanto fizeram que o município de Parnaíba, em 1934, teve desmembrada a área da Melhoramentos, perdendo enorme fonte de renda, na época, talvez a sua principal. Nos 25 anos seguintes, em volta do rio Juqueri, houve uma autêntica revolução nos limotes originais, tendo surgido ali Caieiras, Franco da Rocha, Francisco Morato e Cajamar, para prejuízo de Parnaíba e de Juqueri. Quanto aos curandeiros, que fim terá levado os dois... ou mais?

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