segunda-feira, 31 de maio de 2010

IRARÁ: DINHEIRO PELO RALO

Esqueleto da estação ferroviária de Irará, nunca terminada, nunca utilizada, hoje no meio do matagal no limite da zona urbana dessa cidade baiana, situada a cerca de 30 km de Feira de Santana. Foto de Roosevelt Reis em 2010.

Num e-mail enviado por Roosevelt Reis da Bahia, a história desconhecida de (mais uma) ferrovia brasileira que foi abandonada sem ter sido utilizada após anos de investimento e contrução. Trata-se da linha que deveria ligar o povoado de Ouriçanguinhas à cidade de Feira de Santana, passando pela cidade de Irará, numa dstância de cerca de 70 quilômetros.

O trecho abaixo entre aspas e itálico é uma transcrição resumida (o que está entre parênteses foi colocado por mim) do livro A Construção - Histórias do Mestre Januário, escrito por Emerson Nogueira Pinho, em Irará, Bahia, em 2008.

"Na região do Recôncavo (baiano), a cidade de Cachoeira se tornou um ponto importante para a Bahia devido à ligação com mais de uma cidade, entre elas a principal, Salvador. A linha que corta Alagoinhas a Agua Fria seguindo para Juazeiro era a mais utilizada por nossa cidade (Irará). Através dela ia-se para as cidades de Salvador, Serrinha e Alagoinhas.

Em Irará, o primeiro projeto (ferroviário) foi iniciado no final do século XIX (...) O desvio vinha do Tabuleiro de Iraí e passava pela região da atual avenida Elísio Santana. Sua estação seria onde hoje é o Posto de Saúde, próximo à EMBASA. Chegaram a marcar o local colocando alicerce (...) Esse projeto teve andamento até 1905. Tinha como objetivo chegar a Feira de Santana, mas não foi adiante, não se sabe o por quê.

Em 1946, a região de Irará estava em desenvolvimento (...) quando surge um projeto novo (...) Logo apareceram topógrafos para marcar a 'variante' (...) dessa vez o projeto foi alterado. Seu desvio era em um trecho abaixo de Ouriçanguinhas, vinha cortando fazendas passando por onde hoje é o conhecido túnel, seguindo no sentido de Feira de Santana (...) no final de 1949, chegam a Irará as máquinas (...)


Até hoje está lá para quem quiser ver uma pequena alteração na planície objetivando criar um apoio para a linha do trem. O esqueleto de onde seria a estação (ferroviária de Irará) continua no mesmo local. É localizada na saída da cidade, próxima à rua do Cajueiro. Esse local foi escolhido após uma reivindicação da população que modificou o projeto inicial, visto que a primeira variante foi tirada deixando a estação muito distante do centro da cidade (...) Então construíram o conhecido túnel como alternativa para desviar a linha e dar passagem para a estrada de Água Fria (...)


Este corte se estendeu pela região chamada hoje de Açougue Velho e Quebra Fogo, seguindo pelos povoados da Caroba e Saco do Capim. Neste trecho, foi preciso transferir o velho cemitério da Caroba, pois a marcação da linha passava exatamente por cima do mesmo (...) Em agosto de 1953 começou. Foi uma verdadeira luta, trabalho duro (...) Entraram no ano de 1954 sem parar o trabalho (...) No primeiro trecho (em) que meu avô trabalhou foram feitos treze túneis e bueiros.


Eram obras que necessitavam de muita atenção (...) Prova disto é o velho túnel localizado na saída de Irará-Água Fria. Lá está (hoje) ele firme e forte há mais de 50 anos da construção. Mais tarde, entre os anos de 1956 e 1958, ele foi trabalhar em outra no trecho mais à frente até Feira de Santana. Lá foram fazer uma nova estação
".

Construíram-se túneis, aterros, bueiros e até duas estações para se receber uma linha que nunca operou. A estação de Irará existe até hoje, bem como pelo menos um túnel e aterros. A de Feira foi demolida. Um verdadeiro manual de jogar dinheiro público no lixo. Infelizmente este caso não é único.

A quantidade de ferrovias (recordem-se da variante Hortolândia-Santa Gertrudes, aqui em SP), rodovias (lembram-se da Rio-Santos?), edifícios (o da Eletropaulo) e outras obras que, depois de terem muito investimento, viraram esqueletos abandonados. Os exemplos citados acima são somente isso... exemplos.

domingo, 30 de maio de 2010

A MÃO NEGRA

Francisco Ferdinando de Habsburgo, (quase) Imperador da Áustria, rei da Hungria, etc. , etc. , etc., no distante 1910.

Há exatos cem anos, meu bisavô Giesbrecht morava em Teófilo Ottoni tentando administrar a complicada E. F. Bahia a Minas e fazendo projetos para a sua continuação Minas Gerais adentro. Meu avô Sud tentava começar sua vida profissional de professor primário no distrito de Serrinha (hoje município de Serrana, próximo a Ribeirão Preto) e aguardando todos os meses o salário para gastá-lo todo comprando livros na única livraria de Cravinhos, ali perto. Meu bisavô Daniel tocava a companhia telefônica em Porto Ferreira, e a família Klein tentava tocar a vida lá em Joinville, comandados por meu bisavô Nicolau, aquele que vendia velas com carrinho de mão nas ruas da cidade.

Os brasileiros mais abastados, como os "paulistas quatrocentões" esperavam o embarque para Paris, "cidade das luzes" e, naquela época, local para onde todos iam para depois dizerem que foram, numa viagem de navio de quase um mês só de ida e uma estadia que geralmente não durava menos de três meses. Os Estados Unidos não eram uma opção.

As revistas da época publicavam fotografias da "elite" de então em trajes com ternos e cartolas, os homens quase sempre com barbas grandes e as mulheres com roupas apertadas e desconfortáveis. Também nelas se podia ler os anúncios, os "reclames" de remédios milagrosos que curavam qualquer mal, o que podia ser comprovado sempre por depoimentos de "curados" que vinham do distante interior do Nordeste brasileiro. Provavelmente, para que v. não conseguisse chegar até eles para tentar saber se era mesmo verdade.

O mundo era em branco e preto, a não ser naqueles dias quando alguém o pintava com pincéis que lhe davam cores nem sempre realísticas... as locomotivas a vapor silvavam pelos trilhos brasileiros, e como se construíam ferrovias nessa época! A Paulista estava chegando a Bauru, os gaúchos a Caxias do Sul; a São Paulo-Rio Grande, comandada pelo poderosíssimo Percival Farquhar e seu misterioso sócio francês Hector Legru, construía a ferrovia lá no sul de Santa Catarina - ou seria do Paraná? O Contestado iria ser decidido somente seis anos mais tarde... tinham pressa, pois o ministro argentino Zeballos ameaçava o Brasil com uma invasão e a ferrovia para o sul precisava estar pronta antes disso! Por isso, avançava pela selva ao longo do rio do Peixe tentando chegar ao rio Uruguai pelo meio do nada.

Lá na Europa, enquanto a realeza da Inglaterra, Alemanha, Rússia, Itália, Turquia, Espanha e Portugal visitavam-se mutuamente escondendo as pistolas, o imperador de contos de fadas da Áustria, Francisco José de Habsburgo, tentava salvar seu vasto reino apresentando seu sobrinho-neto, o Arquiduque Francisco Ferdinando, como seu herdeiro, já que seu único filho Rodolfo havia se matado em Mayerling vinte e um anos antes.

Era esse Francisco, de bigodes armados e olhos azuis, que seria apresentado pelo jornal O Estado de S. Paulo em sua edição de segunda-feira, 30 de maio de 1910, como um homem de "cabello cortado á escovinha e já um pouco grisalho", um hábil general e com a confiança do Exército austro-húngaro, mas sem a simpatia, a bondade e a misericórdia de seu tio-avô. Seria um "novo Bismarck".

Não, não seria. Quatro anos e um mês mais tarde, ele seria assassinado com sua esposa nas ruas de Serajevo, então território austríaco, por um estudante de nome Gavrilo Prinzip, pertencente à sociedade secreta sérvia Mão Negra. Este episódio daria início à Primeira Guerra Mundial, também chamada de "Grande Guerra", "Guerra do Kaiser" e outros nomes. Foi esta a guerra que mudou o mundo para sempre, muito mais do que a segunda, esta, na verdade, nada mais do que uma continuação da primeira.

No seu final, em novembro de 1918, já não existiria mais a realeza em seu país, bem como na Alemanha, Rússia e Portugal (esta última, aliás, caiu em 1910 mesmo). A da Turquia e da Espanha não durariam muito, também. Só a da Inglaterra ficou, junto com a da Itália, esta encerrada em 1946. Aliás, no caso da Áustria, nem a realeza ficou, nem o país - o que sobrou da Áustria foi somente o país dos alemães que nela viviam, muitíssimo menor do que o Império, herdeiro do milenar Sacro Império Germânico.

É sempre muito interessante ler as notícias-previsões um dia escritas e que nunca se concretizaram. A vida de meus avôs e bisavôs jamais seriam as mesmas por causa da "guerra para acabar com todas as guerras".

sexta-feira, 28 de maio de 2010

RIO NEGRO

Foto Ralph Mennucci Giesbrecht, em 2006.

Rio Negro, no Paraná. Cidade que hoje tem cerca de 180 anos, fundada na rota das tropas quando ali ainda era território paulista. Conheci-a no distante ano de 1963, no mês de julho, quando fui com meus pais para Porto Alegre, na Kombi 1961 adquirida nova por meu pai.

Dormimos no seminário que existia ali. Ele alugava quartos para pernoite. Ali havia ainda um pequeno museu de insetos, que visitamos antes de deixar a cidade. Havíamos chegado de São Paulo direto até ali, sem dormir em Curitiba. Na época, eu tinha apenas 11 anos de idade.

Voltei a Rio Negro no ano de 2002. Cidade relativamente pequena, tem como base a colonização alemã. Muitas casas de madeira, algumas bem antigas. Gente simpática e acolhedora. Fui ao seminário, que já não o era mais desde 1971, quando foi abandonado pelos padres, que se mudaram para outra cidade cujo nome agora não me vem à memória. O prédio tinha sido reformado em 1997 pela Prefeitura, depois de anos abandonado. O prédio é muito bonito.

Contei minhas aventuras por ali 39 anos antes. Visitei boa parte do prédio a convite da Secretária da Cultura. Fui à capela, maravilhosa. Os jardins são lindos. Tudo muito bem cuidado. Voltei a Rio Negro desde então mais umas três vezes, a última vez em 2008. Sinto saudades de uma cidade que, como todas as outras do Paraná, é muito limpa. No Contestado, em 1916, foi dividida em duas, surgindo, na margem sul do rio Negro o município de Mafra, em terra agora catarinense.

Foi também em Rio Negro que se instalou nos anos 1930 o Batalhão Ferroviário que hoje se chama Mauá e está sediado em Araguari, no triângulo mineiro. Sua função foi de comandar dali a construção da linha ferroviária Mafra-Lajes, aberta definitivamente somente em 1965. Quando a terminaram, foram transferidos, bem como a estação ferroviária, que ficava dentro do Batalhão e foi mudada para o outro lado da cidade, não muito distante do seminário.

A foto acima foi tirada por mim em 2006, e mostra uma bela casa de alvenaria no centro da cidade, a cerca de um quarteirão do rio Negro.

quinta-feira, 27 de maio de 2010

LÍNGUA INDÍGENA PAULISTA

É sabido que os paulistas falavam o neengatu. Falavam a língua geral, ou tupi-guarani. Ou guarani? Há vários nomes para o que os paulistas, descendentes de indígenas em geral, pois os portugueses chegaram aqui na aurora do século XVI sem mulheres. Os que aqui ficaram somente tinham a opção de se acasalar com as nativas. Elas foram as mães, as avós, as bisavós de boa parte dos paulistas.

Como em geral a língua que os filhos falam é a materna, nada de estranho em saber que os paulistas dos séculos XVI, XVII e XVIII falassem uma língua que seria ou a própria língua indígena ou a mistura do português com o guarani, ou seja lá qual fosse o nome. Digo isto porque realmente tenho muitas dúvidas acerca do nome da língua. Leio muita coisa acerca disso que não bate.

Os relatórios para a Corte, no entanto, eram em português. As Câmaras dos Vereadores, por exemplo, tinham sus atas escritas em português. Afinal, a língua dos indígenas não era escrita. Diversas palavras pelo Brasil inteiro, Uruguai, Argentina, Paraguai, Bolívia - neste dois últimos países o guarani é uma das línguas oficiais - têm origem no tupi, ou guarani, ou tupi-guarani, ou neengatu, ou língua geral, esta aqui na terrinha. Qual é o nome certo? Haveria outras línguas parecidas e com nomes diferentes? O que os paraguaios falam é qual delas?

Minha ignorância sobre o assunto é enorme. O certo é que o Marquês de Pombal proibiu o ensino da língua geral em meados dos anos 1700, de forma que o portugês, aos poucos, retornou como língua dos paulistas e de outras capitanias, depois províncias. Porém, no século XIX muita gente ainda falava a língua geral.

Reparemos nos nomes das cidades paulistas (sim, há várias também em outros Estados): Parnaíba, Barueri, Carapicuíba, Piracicaba, Itaquaquecetuba, Itu, Sorocaba e muitas, muitas outras. Rios como o Mogy, o Anhembi, depois Tietê, o Paranapanema, o Paraná, o Paraíba e muitos outros. São nomes que vêm de há muito tempo, muitos séculos. Muitos deles até de antes da chegada dos portugueses.

Mesmo assim, é comum que vamos à procura do significado desses nomes e nem sempre os estudiosos concordem. Há quem diga que Barueri não é palavra indígena, viria do francês. Até Parnaíba foi identificado por um deles como tendo vindo do protuguês perna. Porém, seja qual for a verdade, isso apenas prova que a língua guarani, ou tupi ou neengatu ou seja lá como se chame, sem escrita, dificultava muito o seu estudo.

Por isso é que soa um tanto ridículo a conversão de nomes de cidades, no final dos anos 1800, graças ao nacionalismo e o positivismo reinantes pouco antes e depois da proclamação da República. Cidades como Morro Pelado, Penha do Rio do Peixe e Bica de Pedra, por exemplo, tiveram nessa época seus nomes alterados respectivamente para Itirapina, Itapira e Itapuí, traduções literais, ou quase, de seus nomes portugueses para o guarani.

Mais tarde, isso continuou a existir, principalmente na época das muitas trocas de nomes de municípios, distritos e estações ferroviárias em 1944, advindas da lei federal que proibia o nome repetido dessas unidades no País. Teoricamente, a localidade mais nova era obrigada a trocar de nome e muitas delas escolheram - ou pelos políticos ou pela população - a mudança para nomes índios: nessa brincadeira, que causou uma confusão enorme na época e por muito tempo, Cascavel virou Aguaí e Cristais virou Guapuã e Pau D'Alho virou Ibirarema. Houve casos de mudanças que reverteram ao nome anterior da cidade acrescentada de terminações como "do Sul", "do Oeste", "do Norte", "Paulista" e outras. Isto acontecia quando a população se revoltava com a nova denominação.

Porém, o que me pergunto é: essas palavras índias foram na maioria dos casos inventadas. Em teoria significavam a mesma coisa, mas, na prática, quem é que sabia se essas palavras existiam, numa língua já em boa parte esquecida pelo tempo e sem escrita?

Para quem for me criticar, vou deixar bem claro que a minha ignorância no guarani, língua geral ou seja lá que nome queiram para a língua indígena predominante nesta região, é enorme. Perdoem-me, pois, por qualquer enorme bobagem que possa ter escrito acima. Mas que é tema para discussão, é, sim.

quarta-feira, 26 de maio de 2010

TAV, METRÔ E NORTE-SUL

Foto de TAV extraída do blog de Caio Camargo sobre o TAV em 25/5/2010

Enquanto aqui em Sampa a linha 4 - amarela - do metrô foi inaugurada (mesmo tendo-o sido apenas com um trecho que não liga nada a nada, entre apenas duas estações), em Brasília continua-se discutindo o trajeto da Norte-Sul com gente demais dando palpite e também o TAV Campinas-São Paulo-Rio - que alguns querem transformar no Uberlândia-Campinas-São Paulo-Rio com ramais Campinas-Belo Horizonte e São Paulo-Curitiba - este com mais gente ainda dando palpite.

No caso do TAV fala-se em transporte de pessoas: as linhas comentadas acima realmente passam por regiões de alta densidade populacional, principalmente nos extremos de cada uma. Não há o que se discutir. Já no caso da Norte-Sul a situação é mais complexa, porque os interessados podem montar a rota que quiser e o governo aceitar tudo - só que eles terão de, antes, avisar as empresas que ganharão a concessão para operar a linha.

Afinal, as concessionárias que operam as linhas ferroviárias brasileiras não estão muito interessadas em fazer o que os outros querem, mas sim o que elas querem. Hoje em dia, quase 90% do volume de cargas transportados por elas no Brasil é minério (principalmente de ferro) e grãos (estes, nem 10% dentro dos quase 90%). Portanto, se algum prefeito, governador ou deputado quer que ela passe por "sua" cidade por que acha que ali tem algo que se deve carregar ou descarregar, vai ter de convencer a futura concessionária disto. E não será fácil.

A ALL, por exemplo, que é a mais massacrada pela imprensa nos últimos meses, devido ao grande número de acidentes, sucateamento (supostamente) irregular de material rodante e falta de tráfego em linhas que estão sob sua responsabilidade, está se recusando a embarcar cargas em Campo Grande, MS, exigindo que os interessados a levem, pelo transporte que lhes aprouver, ou para o terminal de Alto Taquari, no Mato Grosso, ou para Maringá, no Paraná, por rodovias em estado próximo ao intransitável.

Curioso: Campo Grande tem ferrovia - a finada Noroeste do Brasil. Por que a ALL se recusa? Ela tem esse direito? Talvez até tenha, se o contrato realmente for mal feito - mas concessão de ferrovias, onde se joga os transportes do país na balança, ou, num universo maior, sua infraestrutura, não pode ser tratado apenas como algo que dê o máximo de lucro possível. Precisa, também, ter responsabilidade de resolver um problema do país. E isso a ALL não vê e nem o governo tem um mínimo de controle.

É sinal de que o governo não tem política alguma de transporte nem de infraestrutura. Trata o problema, quando trata, apenas após uma grande desgraças ou pressões grandes. E trata mal. Lembram-se do caso dos aeroportos há 2-3 anos atrás? Pois é. Ali ele teve de agir. E agiu mal. Agora, com as ferrovias, ele ainda não acordou. Se elas pararem de repente, vai ser o caos. Não se espera que isto aconteça, mas sim que haja pelo menos o estabelecimento de uma política séria e de controle sobre as concessionárias.

terça-feira, 25 de maio de 2010

O RAMAL DE SERTÃOZINHO

Ramal de Sertãozinho em 2001, próximo a Ribeirão Preto. Foto Rodrigo Cabredo

O ramal de Sertãozinho foi contruído pela Companhia Mogiana no final dos anos 1890 e terminado em 1914, quando se juntou à ponta do ramal do Pontal, em Pontal, da Paulista. Em 1970, como ambos tinham bitola métrica e pertenciam a duas ferrovias já estatizadas, o segundo passou à Mogiana, que passou a administrar o ramal, do seu início em Barracão, Ribeirão Preto, a Passagem, na bitola larga da Paulista. Também vale lembrar que nessa época o ramal de Pontal havia se tornado o único ramal de bitola métrica da Paulista, com todos os outros já desativados e arrancados.

O ramal de Sertãozinho e o de Pontal já eram nessa época decadentes; somente haviam sobrevivido por terem sido considerado pelos militares como "de segurança nacional", pois uniam duas das ferrovias mais importantes do Estado, a Mogiana e a Paulista. Os trens de passageiros que por ele passavam já percorriam apenas o trecho que já era da Mogiana, Barracão-Pontal, passando pela cidade de Sertãozinho. Pararam em 1976.

Região com enorme produção de cana de açúcar, o transporte de cana por trem era, paradoxalmente, cada vez menor. Com o advento da sombria FEPASA, perdeu movimento e os caminhões passaram a fazer o transporte de cana da região quase que monopolísticamente. Tentou-se, nos anos 1980, usar o ramal para carregamentod e combustíveis, incluindo o álcool de cana; havia um terminal de combustíveis na saída de Ribeirão Preto, perto do ramal, e um posto de carregamento próximo à velha estação de Sertãozinho, posto esse que passou a ter o nome de estação de "Sertãozinho-nova". Não vingou. Em 1998, quando a FEPASA foi privatizada, o movimento no ramal era praticamente apenas de locomotivas e autos de linha eventuais para fiscalização de linha.

Entrou a concessionária e, entre notícias alardeadas pelos jornais da região de que o ramal passaria a carregar álcool e cana, o mato e as ruínas passaram a tomar conta dos trilhos. Roubos destes passaram a ser constantes. Na cidade de Pontal, onde eles passavam pelas principais ruas do centro, junto à abandonada estação ferroviária, o asfalto cobriu tudo.

Nos últimos meses surgiram notícias de "trens turísticos" que usariam parte do ramal - uma forma de o governo enganar o povo em vez de investir em transporte sobre trilhos aproveitando o leito já existente. Esta semana, para avacalhar de vez, a Prefeitura andou anunciando a construção de uma avenida com a retirada dos trilhos. Só que o Ministério Público resolveu bater o pé: se já tem trilhos, que se use para colocar um VLT. Afinal, eles passam por uma zona bem populosa do município de Ribeirão Preto e atingem uma cidade desenvolvida, Sertãozinho.

Não sou prefeito de nada, não quero ser nem vou ser: mas sei que avenidas hoje deterioram um local muito mais rápido do que trilhos. Porém, prefeitos têm um caso de amor com avenidas, então... poucos, no fim, percebem as vantagens de se aproveitar os trilhos para usos... de trilhos. Recentemente, Macaé, RJ, anunciou exatamente o seu uso para colocar VLTs. Oxalá se concretize. Fizeram o mesmo no Juazeiro e no Crato, que parecem estar no fim do mundo em relação a nós, mas com prefeitos de mais juízo e vergonha na cara.

Parece que a chamada "locomotiva do Brasil" está saindo dos trilhos: são os vagões que estão mostrando o caminho certo.

segunda-feira, 24 de maio de 2010

O ESTADO DE SÃO PAULO EM 1600

Nas minhas limitadíssimas capacidades com o programa de desenhos, tento comparar os limites do atual Estado de São Paulo (contorno em preto) com o que seriam os territórios das capitanias de São Vicente (esta dividida em duas porções) e a de Santo Amaro (no meio das duas porções da outra). Em vermelho, o que resultou disto, considerando-se a linha aproximada de Tordesilhas. Desconsiderei os territórios das capitanias em Estados como o Paraná, Minas e Rio. Estão localizadas os cinco municípios da época.

Como seria o Estado de São Paulo em 1600?

Em primeiro lugar, há que se definir o que chamaríamos de "estado de São Paulo" naquela época: havia a capitania de São Vicente, com delimitações em linha reta a partir mais ou menos da cidade de Macaé, hoje Estado do Rio de Janeiro até Caraguatatuba. Daí para o sul, a Capitania de Santo Amaro, até a ilha de Santo Amaro (Guarujá). E mais ao sul, da ilha citada até Cananéia, a segunda secção da Capitania de São Vicente - que abrigava o primeiro município constituído no Brasil, a atual cidade de São Vicente.

Se juntássemos os três, elas englobariam terras de cinco Estados hoje: São Paulo (menos o extremo norte), Minas Gerais (pequeníssima parte do sul), Rio de Janeiro (3/4 do atual), Mato Grosso do Sul (a metade sul) e Paraná (a metade norte). Porém, as capitanias chegavam em domínio apenas até parte do atual território desses Estados interior adentro: elas paravam no meridiano de Tordesilhas.

Tordesilhas passava, com extrema aproximação, onde hoje estão cidades como Olímpia, Catanduva, Bauru, Cerqueira César e Itararé. Portanto, o Mato Grosso do Sul de hoje estaria fora, assim como quase todo o Paraná (o meridiano passava próximo à atual Curitiba). Imagine então, isso seria o Estado naquela época, "dividido" em duas capitanias, sendo que uma delas tinha duas porções. No início do século XVII, elas se juntaram, absorvidas por São Vicente, mas, em 1600, não eram um bloco conjunto.

Nesse bloco dividido havia cinco vilas (os municípios de hoje): São Vicente, Santos, Itanhaém, Cananéia (criada em 1600) e São Paulo. Este último era o único município no planalto. A cidade era, então, "boca-de-sertão": além dela, para oeste e norte, nada existia, a não ser três pequenos povoados a cerca de 30-40 km da futura capital: Aldeia de Carapicuíba, Aldeia de Barueri (não nos locais onde hoje está a sede dos dois municípios) e Parnaíba, além de povoados que hoje são bairros da Capital: Pinheiros, Penha, Freguesia do Ó. Os dois últimos às margens do Tietê. Talvez alguma outra coisa, extinta hoje ou não.

Enfim: se considerássemos São Paulo de 1600 como tendo os limites que tem hoje, a civilização não passaria de 40 km a oeste da sua atual capital. Dali para a frente, o "sertão desconhecido povoado por índios". Curioso que esta expressão se manteve até próximo de 1920, portanto 320 anos mais tarde: até o ano de 1900, essa expressão começava, coincidentemente ou não, no já de há muito então extinto meridiano de Tordesilhas.

domingo, 23 de maio de 2010

MUSEU VIVO

Mapa do Gato Preto à esquerda da Via Anhanguera (clique para ampliar) (Google Maps, modificado por este autor em 23/5/2010)

Ontem falei sobre o bairro do Gato Preto. Hoje continuo, pois acabei não concluindo meu raciocínio. O fato é a parte baixa do Gato Preto é um museu vivo, e estou aqui incluindo a parte que fica do outro lado da via Anhanguera em relação ao forno de cal e às antigas oficinas da Perus-Pirapora.

Num município feio e sem atrativo algum, a manutenção dessa área depois de um restauro nos prédios e nas locomotivas e vagões, mesmo se fossem somente os que ainda restam por lá, seria uma benção. Não faltaria público. Afinal, a Grande São Paulo da qual Cajamar faz parte, tem 20 milhões de pessoas ávidas por algum divertimento. E bem pouca gente sabe que o Gato Preto existe e o que há nele.

O problema é que praticamente a área toda, especialmente a que está no lado das oficinas, é particular e seu dono pouco se importa com ela nem com o que ela contém. E ele tem esse direito, pois é o dono. Faz com ela o que quiser. As únicas coisas que não pode destruir são as máquinas e os vagões. O resto não está tombado, como os primeiros estão. É uma questão de tempo, apenas. A prefeitura também não mostra a menor intenção de tombar nada, pois provavelmente não quer criar caso com uma pessoa que, dizem, é dona de metade da área do município inteiro. Não sei se chega a tanto, mas as terras em sua posse são muitas.

Vamos, no entanto, ficar no imaginário. Restaurem-se as locomotivas e carros, mesmo que seja "cosmético", ou seja, deixá-las autênticas na aparência mas sem funcionar. Restaurem-se os prédios da oficina, a estação, chaminé e o forno de cal; mantenha-se as pessoas que hoje vivem nas casas habitáveis: tirá-las para que? Afinal, elas fazem parte do museu. Capine-se o matagal e principalmente, limpe-se a enorme sujeira que impera por ali. Mantenha as ruas de terra como são; limpe-se o rio Juqueri-Mirim, que corta o Gato Preto e segue acompanhando o antigo leito que ligava as oficinas à linha principal da E. F. Perus-Pirapora. A única coisa que estraga é a via Anhanguera, que em 1943 cortou o bairro em dois. Mas daria para se viver com ela.

Pronto: estaria pronto o museu vivo. A história do bairro seria contada por gente que a conhece, mostrando como um lugar onde não existia nada recebeu há cem anos atrás uma oficina de locomotivas e um forno de cal e progrediu. Chegou a ter dois clubes para recreação. Nos anos 1960, a polícia tinha de ser chamada para proteger os carros-pagadores em dia de pagamento de funcionários.

Se possível, ponha-se uma das locomotivas para funcionar no fim de semana para que os interessados vejam como eram os famosos "bons tempos". Pronto: o museu vivo está montado. Pena: nada disso acontecerá.

sábado, 22 de maio de 2010

GATO PRETO

Em 2003, como hoje, a parte baixa do Gato Preto no km 36 da Anhanguera era isto: além das casinhas ao lado do antigo forno de cal, a oficina com o outro bar à direita (não aparecem) e a antiga estaçãozinha à esquerda (não aparece também)

Hoje pela manhã mais uma vez estive no Gato Preto. Para quem não sabe, embora já tenha postado algumas matérias sobre o bairro neste blog, ele fica no município de Cajamar, à margem esquerda da via Anhanguera, no km 36. Local muito calmo, ele na verdade está dos dois lados da estrada: é ao lado esquerdo que geralmente vou por causa das antigas oficinas da E. F. Perus-Pirapora.

O bairro existe por causa da instalação de fornos de cal e das oficinas da ferrovia citada, esta aberta em 1914. Sempre foram ambos do mesmo dono. Os últimos foram a família Abdala, que fecharam tudo - ferrovia e fornos, em 1983, quatro anos antes de fecharem também a fábrica de cimento de Perus, que administrava os dois.

O fato é que o fechamento foi bastante surreal: num belo dia de janeiro desse ano, veio a ordem para que cessassem as operações no local e nos outros pontos da ferrovia. O que estava em determinado local, ali ficou. As locomotivas, vagões e carros ficaram onde estavam, inclusive alguns vagões carregados com minério que deveriam seguir viagem no pátio da pedreira da empresa, em Cajamar (hoje de posse da Votorantim). Até hoje os vagões com o minério estão ali esperando seguir viagem.

Em Gato Preto, em volta da oficina, na parte baixa do bairro, fornou-se uma pequeníssima vila que ainda existe. Poucas casas, espalhadas, além de dois bares, o forno de cal, este abandonado, e as oficinas, ainda ali, com um ou outro vagão e quatro locomotivas abandonadas ao relento. Restos da base de pedras de uma antiga ponte metálica da ferrovia, uma ponte sobre o rio Juqueri-Mirim, o próprio rio sujo e assoreado... o local foi esquecido pelo tempo. Até 2003 ainda havia trilhos fora da área da oficina, depois foram arrancados. Vez por outra aparece alguém do IFPP, que tenta recuperar o que for possível da antiga ferrovia, esta prestes a completar cem anos do início das operações.

Dentro do pátio das oficinas, trilhos e material rodante, bem como peças pesadíssimas de ferro fundido estão abandonadas. Nos galpões, alguns telhados já caíram, outros esperam por isso. As plantas invadiram tudo: pequenas salas e escritórios e também máquinas, Uma debulhadora de arroz de madeira, raríssima, ainda está ali escondida.

Há também materiais mais novos: um fogão Semer, uma Brasília... mato, lenha, trilhos que não foram arrancados. Do lado do bar ao lado do antigo forno de cal, um morador aponta para um morro do outro lado da rodovia e diz que ali algumas construções recentes acabaram com diversas nascentes. Aponta para outro lado e diz que "aquele plano ali já foi um morro — dois anos atrás, foi arrasado". A terraplenagem está sendo feita mais para a frente, sentido de Jordanésia: parece que quando chegar à oficina e ao forno vai levar tudo também.

O material ferroviário tem de ser removido, mas a entidade que cuida corre atrás de fundos para isso. Quando for, possivelmente tudo virá abaixo. Se estamos ali, parados, junto à chaminé do forno de cal, que já tem uma grande árvore apoiada sobre a boca dessa chaminé sabe Deus como, olhando para a estrada, vemos uma paisagem bonita e sentimos uma calma enorme. Sossego que logo será substituído pela construção de galpões para indústrias. O dono não se preocupa com o sossego de quem vive lá, gente que provavelmente vai sair ou ter de sair dali quando isso acontecer.

Será o fim do Gato Preto. Se sobreviver, vão sobrar apenas as casas e a escola que não se veem dali de baixo, pois estão nas ruas "mais para cima". A Perus-Pirapora, ali, pelo menos, será somente uma saudade.

sexta-feira, 21 de maio de 2010

ESCULHAMBAÇÃO

Pelo visto, são estes trens de subúrbio (aqui, passando pela favela que se instalou em Jacarezinho às margens da linha da Supervia, no Rio de Janeiro), que o prefeito de Sorocaba acha que vão ser usados pela CPTM para ligar a Capital ã pobre cidade que ele diz que administra (Agencia Estado).

Duas notícias hoje me chegaram de diferentes formas. A primeira relatava um fato estarrecedor: o cúmulo da esculhambação. Uma favela estava sendo retirada de dentro da faixa de domínio dos trens da Supervia, cercada por muros e com trens metropolitanos passando a toda hora. Pelo número e tipo de casas que estavam ali, isso não foi instalado ontem. Deveria ter sido retirado logo após o início da construção do primeiro barraco (nenhum maquinista, por exemplo, viu?). Mas não. Esperaram sei lá quanto tempo para retirar tudo.

Enquanto isto, os trens passando. Se tivessem pegado alguém , começariam aquelas velhas histórias já vistas muitas e muitas vezes na televisão: "queremos justiça", choro em frente às câmaras, do tipo "ele era um bom rapaz, trabalhadô", e ainda "o maquinista foi levado para a delegacia para explicar por que ele não parou o trem". É o fim da picada.

Logo depois, mandaram-me uma reportagem publicada hoje no jornal "O Cruzeiro do Sul", de Sorocaba. Foi-me enviada em vista da postagem de ontem que aqui fiz sobre trens de passageiros da CPTM para Sorocaba. E afirma algo inacreditável. Os prefeitos da cidade e de outras como São Roque não estão querendo os trens "de subúrbio", pois acham que isso irá transformar as cidades em "cidades-dormitório".

É o fim da picada. Uma estupidez que mostra claramente que essas pessoas não podem ocupar o cargo que têm. Ora, Sorocaba e São Roque tiveram trens de passageiros ligando-as a São Paulo por exatos 129 anos (1875-1999) e não se tornaram cidades-dormitório. Já há pelo menos 80 anos têm ônibus com horários muito mais frequentes que sempre foram os trens ligando-as à Capital.

Eles estão sendo pressionados pelo conhecidíssimo lobby das empresas de ônibus, que temem perder sua boquinha (como se fossem)? Eles ainda pensam que "trens de subúrbio" - termo que vai caindo em desuso cada vez mais, pelo menos em São Paulo - ainda são aquela esculhambação que eram até 15 anos atrás? Será que se chamasse de "metrô" os novos trens, eles também diriam o que o jornal escreveu, dito pelo prefeito de São Roque: "não podemos aceitar trem de São Paulo até Sorocaba, porque dai viramos cidades dormitórios. Vemos dezenas de cidades totalmente deterioradas e com superpopulação por causa disto”. Danem-se as pessoas que vão e vêm todos os dias até e da Capital, então, rodando 60 km em automóveis e ônibus, passando por lombadas e buracos e sacolejando para todo lado. Quanto será que ele acha que custarão esses trens? 2, 3 reais?

Há algo de podre no reino da Dinamarca, ou então, esses caras que se dizem prefeitos são mesmo péssimos administradores. Enfim, esculhambação é o que não faltou hoje. No Rio e em São Paulo.

quinta-feira, 20 de maio de 2010

VOCÊ VIU UM TREM DE PASSAGEIROS POR AÍ?

Ah, os carros Pullman com poltronas giratórias da gloriosa Paulista... hoje obsoletos, mas eram bonitos e confortabilíssimos... foram afastados e depois sucateados em 1978

Os trens para o interior anunciados há poucas semanas para serem administrados pela CPTM continuam no noticiário - grças a Deus. Porém, nem sempre "bem na fita": na semana passada, o atual Governador afirmou que o estudo não poderia estar pronto em tão pouco tempo quanto foi anunciado e que, portanto, a instalação desses trens deveria demorar mais do que foi anunciado. Ele tem razão.

Porém, o jornal O Estado de S. Paulo de hoje afirma que o estudo dos trens para Sorocaba e para Santos já estariam prontos. Quem está falando a verdade, a CPTm ou o Governador? Ou os estudos já vinham sendo feitos antes de serem anunciados? Também é uma forte possibilidade.

Porém, os entendidos dizem que para que eles sejam competitivos - não adianta instalar os trens envelhecidos que vinham rodando no final da era Fepasa - terão de trafegar por uma linha nova, paralela à linha existente, que continuaria sendo utilizada pelos cargueiros. Isso não é um problema enorme na linha para Sorocaba - mas para Santos, pode ser: a descida da serra ao lado da cremalheira não tem muito espaço, considerando-se os túneis e os viadutos. Novos teriam de ser construído para uma linha moderna, e isso, bom, isso é caro.

Enfim, as dificuldades são muitas. Elas existem também no leito entre as estações de Manoel Feio e Suzano, da antiga Central, a primeira na variante de Poá onde se junta a variante do Parateí, e a segunda no ramal de São Paulo onde se encontra com a variante Suzano-Ribeirão Pires. A ideia é construir uma linha que já deveria existir há pelo menos quarenta anos, para os cargueiros chegarem do Vale do Paraíba e descerem para Santos sem se "enroscarem" com os trens da CPTM. A MRS entrou com pedido de avaliação ambiental para isso.

Enfim, construção de novas linhas, mesmo que bem próximas às já existentes, sempre caem na burocracia governamental das licenças ambientais, que, muitas vezes, são apreciadas de forma exagerada e mesmo assim contestadas pelo Ministério Público, que muitas vezes crê que entende mais de meio ambiente do que os especialistas no assunto.

Já vi esse filme antes. Lembram-se da linha do Aeroporto por Guarulhos? Aliás, esta linha parece estar no limbo - ninguém fala mais dela, infelizmente. Outra linha extremamente necessária, pois, depender da Marginal do Tietê e do Rodoanel - que naquele ponto nem existe ainda e pelo visto vai demorar - para se chegar ao Aeroporto já está mais do que claro que é péssimo negócio.

Interessante que no Brasil todos concordam que as coisas são necessárias, mas ninguém consegue tocar as obras para isso em tempo hábil. O dinheiro jogado fora em todos esses processos é impressionante. E haja impostos para custear todos os absurdos.

quarta-feira, 19 de maio de 2010

DIREITO DE IR E VIR

Bom, não sei onde é, mas não importa. É muito carro e quem está ali em baixo não está nada feliz (Foto protopia.wikispaces.com/file/list)

Costumo sair de casa todos os dias às 8 e meia da manhã, com minha filha, para ir ao escritório. Ela vai para o dela e sempre quer dirigir quando eu vou junto. Não entendo por que. Ela, pelo visto, gosta de sofrer no trânsito. Todos os dias, a Marginal do Pinheiros está congestionada. Todos. Sair do Alphaville para pegar a Castelo até que não tem sido difícil. Vamos ver até quando. No fim do dia, porém, a situação se inverte: como saímos pela Eusébio Matoso, a Marginal até a Castelo costuma ser tranquila, a Castelo até o Alphaville dá para engolir. Já dentro do Alphaville, o trânsito é caótico a essa hora.

Hoje de manhã tive ir a Santana de Parnaíba (downtown) antes de ir para São Paulo. Saí de casa às 7 e meia da manhã. O trânsito estava horroroso em boa parte do caminho para a cidade (o caminho é oposto à saída para a Castelo Branco). Quando se sai do Alphaville e se entra na estrada praticamente rural - os 3 a 4 km que ligam o bairro ao centro de Parnaíba - fica tranquilo. Cheguei lá entreguei o que tinha de entregar e voltei. Eram 7 e 55 quando deixei a cidade. Chego a Alphaville e tudo entupido de carros, até chegar em casa para dali sair para São Paulo.

Como se vê, o "tranquilo" bairro de Alphaville, como as imobiliárias ainda o vendem, não o é mesmo. Enquanto dirigia, ouvia o rádio: não era somente ali que tinha problemas. Em Guarulhos - município com 1,3 milhões de habitantes (dado informado pela rádio) - uma greve de ônibus foi deflagrda nesta madrugada, sem prévio aviso. O trânsito estava mais caótico do que o normal e não havia ônibus algum na rua. O pvo que se dane, como sempre, porque os motoristas querem que ele "entenda seus problemas e apoie suas requisições". Belo sonho, mas nada muda. Bando de irresponsáveis.

Leio rapidamente o jornal na passagem por minha casa e vejo que o trânsito no Morumbi, insuportável nas manhãs e fim de tarde está pior do que nunca. Uma avenida (como se ainda fosse o tempo em que as avenidas resolviam problemas) foi anunciada há um-dois anos atrás na região de Paraisópolis, apesar do nome, uma favela) mas agora ela foi reduzida à metade da extensão (e ainda não está pronta) e vai terminar no meio de lugar nenhum. Não vai resolver nada. Ainda por cima, os bandidos ainda assaltam os carros na lentidão da avenida Giovanni Gronchi. E fica tudo por isso mesmo.

Saio então para São Paulo, com minha filha dirigindo. Chove muito e São Paulo tem o quarto maior congestionamento do ano, segundo a rádio. 143 km. Eu certamente fiquei no meio dess quilometragem, na Marginal.

Há pouco mais de um mês, meti o pau na greve dos professores. Comentaram neste blog que eu achava que o trânsito que eles pioravam com suas manifestações era mais importante para mim do que o ensino. Não é, mas será que o sagrado direito de ir e vir é menos importante do que ser educado? Enfim, estou naqueles dias de falar: - está tudo errado!

segunda-feira, 17 de maio de 2010

COLONIZAÇÃO PAULISTA: A OBRA QUE FALTA

Casa-sede da colônia militar de Itapura, estabelecida em 1858 e ainda de pé em 2006 (Foto de Ismael Gobbo)

Houve um tempo em que, em teoria, a Capitania de São Paulo (antecessora da Província e do Estado de São Paulo) ocupava uma imensa parte do que viria a ser o Brasil. Também em teoria (porque os limites dos mapas hoje feitos apenas mostram os limites dos Estados atuais que se formaram naquela época), englobava não somente São Paulo, mas também Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Minas Gerais, Goiás e Tocantins.

Isto vigorou até 1853, quando o último dos Estados (na época, províncias) se separou - o Paraná. Cem anos antes (1748), a Capitania de São Paulo, que por sua vez era a sucessora da Capitania de São Vicente, foi extinta quando perdeu as capitanias de Mato Grosso (a original) e de Goiás: a Corte decidiu que, devido a ter ficado com território muito pequeno (território este que ainda englobava São Paulo para o sul, até o Uruguai), não havia mais motivo para se mantê-la. Ela passou, então, a fazer parte da Capitania do Rio de Janeiro.

O erro foi corrigido apenas 17 anos depois: a Capitania foi restaurada em 1765, pois o Rio de Janeiro, já capital do Vice-Reinado, não tinha como governar uma área tão grande. A primeira capital (provisória) da Capitania restaurada foi Santos, voltando logo em seguida para a cidade de São Paulo. A ordem do Morgado de Mateus, novo governador, era: povoar a província com urgência. Realmente, durante seu governo e de seus dois sucessores, foram fundadas várias cidades como Campinas, Araraquara, Piracicaba e outras, além de ter sido construída uma estrada moderníssima para o porto de Santos (moderna para a época): a Calçada do Lorena.

A Província (a partir de 1822, da Independência), no entanto, foi avançando muito lentamente para oeste. As terras para lá (no sentido oeste) de Araraquara eram ainda virgens. No final do século XIX, já em plena República, o já Estado de São Paulo tinha suas cidades do seu então extremo oeste ainda em Avaré, Bauru e Rio Preto, cidades com infraestrutura precaríssima e distantes de tudo.

No então "sertão desconhecido, povoado por bugres", apenas alguns aventureiros se infiltraram durante o século XIX, tendo constituído vilas minúsculas e pouco duradouras. Um dos mais famosos foi João Teodoro, que muito tempo depois foi agraciado com o nome de uma estação ferroviária da Sorocabana (1917), que gerou um município que, em 1939, teve o nome alterado para Martinópolis. Houve outros aventureiros, em geral gente que imigrou de Minas Gerais, como ele mesmo. Diversas cidades de São Paulo foram fundadas no século XIX por mineiros que "voltavam" às origens - afinal, os fundadores das cidades mineiras mais antigas eram paulistas - os emboabas.

Fora isto, a rivalidade com os países do Prata também gerou uma tentativa tímida de povoamento por parte do Império, como a fundação de duas colônias militares - Itapura e Avanhandava. As duas desapareceram rapidamente, quando a ameaça paraguaia foi reduzida a nada, com a derrota acachapante sofrida pelo Paraguai em 1870. A casa da colônia de Itapura ainda existe, mas a outra, de Avanhandava, já era ruínas no longínquo ano de 1886.

O mesmo tipo de desbravamento tardio se deu no Paraná e em Santa Catarina. Somente nos anos 1950 São Paulo, Paraná e Santa Catarina estavam totalmente desbravados. O mairo colonizador, o que acelerou muito o processo lento até fins do século XIX, foi a ferrovia. Ou melhor, "as": Paulista, Sorocabana, Noroeste e E. F. Araraquara.

A história que conto acima é um retrospecto extremamente resumido do que foi a conquista do oeste paulista. Porém, essa história ainda não foi contada por ninguém em conjunto, com detalhes que devem ter sido maravilhosos e trágicos ao mesmo tempo. Procura-se alguém que junte os retalhos de história e faça uma obra magnífica como essa.

domingo, 16 de maio de 2010

UM ALMOÇO EM CRAVINHOS - 1932

Meu avô Sud viajava pelo Estado inteiro, principalmente quando estava ocupando algum cargo de relevância. Em maio de 1932, ele era Diretor Geral do Ensino do Estado, cargo que atualmente é o de Secretário Estadual da Educação.

Como o meio mais confortável de se viajar era de trem, era esse o transporte que ele utilizava em grande parte das vezes. Nesse dia (da carta acima), 21 de maio de 1932, ele chegou a Cravinhos e, descendo na estação da Mogiana, atravessou a praça e foi para o hotel Pires, esse que tem o logotipo na carta. Foi participar de um almoço com, provavelmente, políticos e professores da cidade e da região.

Era costume na época que todos assinassem um papel - uma espécie de documento - e o entregassem à pessoa principal do almoço. Sendo Sud essa pessoa nesse dia, ele levou a carta para seus arquivos. Setenta e oito anos mais tarde, eis que a desenterro dos papéis de meu acervo.

Dos nomes que constam do documento, não reconheci nenhum. Mas certamente haverá pessoas que saberão de quem se tratam os signatários.

De qualquer forma, é um documento histórico. Apenas para localizá-lo no tempo, esse dia foi um sábado: dois dias depois, quatro estudantes foram mortos no centro da cidade de São Paulo: Marcos, Miragaia, Drausio e Camargo - o MMDC. Sud havia retornado à Capital poucas horas antes do tiroteio e por causa disso chegou atrasado a seu escritório, que era a poucos metros de onde se deu o triste caso. Ele não o presenciou.

sábado, 15 de maio de 2010

O RAMAL DE BARRA BONITA E RIO DO PEIXE

Estação de Japira, antiga Barra Bonira, no ramal do mesmo nome.Cortesia Flávio Cavalcânti

Hoje recebi uma mensagem perguntando sobre a estação de Eusébio de Oliveira, penúltima parada do já extinto ramal de Barra Bonita e Rio do Peixe, nome comprido para um ramal relativamente curto no Paraná.

Quando ele começou a ser construído, na segunda metade da década de 1910, a única cidade que existia no seu caminho era a de Tomasina, vila fundada no século XIX por mineiros que lá se instalaram. Todas as outras cidades que se constituíram ao longo do ramal o fizeram por causa deste, nascendo de uma simples estação.

O mais curioso é que os 117 km deste ramal demoraram 49 anos para ficarem prontos. A estação terminal, Lisimaco Costa, foi entregue em 1948 e extinta com o ramal 21 anos mais tarde. Ele havia sido construído para a exploração de carvão mineral por praticamente toda a sua extensão, porém, as minas mais promissoras estavam perto de Lisímaco.

Pesquisei durante algum tempo para verificar o motivo do fechamento deste ramal. Não consegui determinar se teria sido pelo esgotamento das minas ou se pela má qualidade do carvão produzido. Pode ter sido, também, pelo fato de se ter preferido o transporte por via rodoviária, situação comum neste país.

Outro fato interessante: o Estado do Paraná não teve nenhuma linha fechada durante os seus hoje 130 anos de ferrovias que não o tivesse sido por causa de substituição por uma linha mais moderna. A única exceção foi o ramal de Barra Bonita.

sexta-feira, 14 de maio de 2010

AS PONTES DE TRÊS RIOS

Ponte das Garças - a original, sem data. Ficava entre Três Rios e Petrópolis.

A Central do Brasil, em sua linha do Centro, ou seja, sua linha mais longa, que ligava o Rio de Janeiro a Monte Azul, norte de Minas (embora com quebra de bitola), costeava o rio Paraíba do Sul e o rio Paraibuna durante uma boa distância, na divisa Rio de Janeiro-Minas. Cruzava os rios para lá e para cá para aproveitar o terreno e não ter de fazer cortes e túneis demais. Preferia as pontes.

Próximo a ela, a Leopoldina também passava pela região, misturando-se com a linha da Central em alguns lugares. O município de Entre Rios, a partir de 1943 chamado de Três Rios, era um deles.

Em Três Rios cruzavam diversas linhas. Pelo pátio ferroviário dessa cidade passavam a linha do Centro, vinda de Barra do Piraí e seguindo para Juiz de Fora, a linha da Leopoldina que vinha de Petrópolis e seguia para Ubá e a linha Auxiliar, que vinha de Paraíba do Sul e seguia para Porto Novo do Cunha. E haja pontes na região.

As pontes da Central eram as mais bonitas. As da Leopoldina, nem tanto. Porém, havia uma desta última que era bem bonita. Ela ficava sobre o rio Paraíba do Sul, na linha que ligava Três Rios a Petrópolis. Era a ponte das Garças. Certamente havia por ali muitas dessas aves. A que existe hoje não é a que foi fotografada acima (foto enviada por Jorge Alves Ferreira Jr.): ela foi desmontada e substituída por uma mais recente, de aço. Esta última está lá até hoje, mas não é tão bonita quanto a original. Hoje, sem trilhos, é uma ponte somente para pedestres: está em zona urbana.

A Leopoldina seguia também para o norte, acompanhando o rio Paraibuna, afluente do Paraíba, e cruzando-o em Praia Perdida: aqui estava - e ainda está, também sem trilhos e abandonada - a Ponte dos Ingleses. Ou seja, a maior parte dessas pontes tinha nomes, oficiais ou, como na maioria das vezes, populares.

A citação da Ponte das Garças vem hoje à minha mente pois há alguns dias recebi uma fotografia dela - da original - que mostrava um carro cruzando-a, sobre os trilhos. Era um Ford Victoria, de posse do avô de uma conhecida, a que mandou a foto. Em seguida, ao vê-la, Jorge mandou outra foto da ponte, com fotos da ponte atual e também da ponte dos Ingleses.

quinta-feira, 13 de maio de 2010

MEMÓRIAS DE MINHA MÃE

"Olhos Grandes" - 1926

Meu avô Sud chegava em casa todos os dias e encontrava as três filhas juntas esperando junto à porta. Apontava para cada uma delas e dizia: "Olhos grandes!" (para minha mãe, Astrea, a mais velha). "Olhos azuis!" (para Lélia). "Olhos doces!" (para Mévia, a mais nova).

Na época em que ele foi Diretor Geral do Ensino, de 1943 a 1945, a casa vivia cheia de gente à noite: eram, principalmente, professores e professoras. Minha avó Maria ficava nervosa e corria para a cozinha para fazer bolinhos e preparar ponche - ponche quente, que não era comum, mas que todos apreciavam. Depois, guardava os licores coloridos em garrafas que punha num armário baixinho de madeira (conheço esse armarinho: muito bonito) e guardava os salgadinhos e doces numa gaveta trancada no bufê da sala.

Anos mais tarde, surpreendeu-se ao saber que meu tio Flávio (irmão temporão de vovó, não muito mais velho que Astrea) descobriu que retirando a gaveta de cima, que não tinha chave, ganhava acesso aos acepipes e pegava-os, distribuindo à Astrea e irmãs, para que elas não o caguetassem. "Por que não me contaram?", perguntou à minha mãe, então já casada. Resposta: "ah, o Flávio é que chegava com os doces e não nos dava, nós não sabíamos onde ele os arranjava". Era mentira. Vovó ficou brava por saber.

Mamãe brigava com meu tio Aécio, seu irmão, nem três anos mais novo do que ela. Para se vingar, ele ia à garagem, onde Astrea guardava suas panelinhas de barro trazidas de Minas com que brincava, atirando-as ao chão na frente dela. Aí era uma gritaria. Vó Maria batia nos dois, pois nenhum admitia culpa alguma. Batia mais na mamãe e nem tanto no Aécio. Anos depois, vovó disse que fazia isso porque a mamãe não chorava, ficava com cara de durona, aguentando o tranco. Já Aécio morria de medo de apanhar, chorava e gritava e vovó ficava com pena.

Astrea já estava maior e saía com a prima Meire para passear. Lélia, seis anos mais nova e criança ainda, chorava no portão da rua Capitão Cavalcânti, na Vila Mariana: "eu também quero ir". Chegava a Baia (a empregada) e perguntava à mamãe o que ela tinha feito. Resposta: "nada, só vou sair e não vou levar a Lélia". Baia, então, levava Lélia, distraindo-a com uns docinhos.

Vovô resolveu comprar uma casa "no interior" para descansar durante os finais de semana e achou uma chácara em Mogi das Cruzes (já falei sobre ela por aqui). Disse a Maria que precisava pedir um empréstimo e se Maria concordava. Vó Maria respondeu: "não precisa, eu tenho o dinheiro. Economizei do que você me dava para as compras". Sud achou o máximo. Pegaram o dinheiro (incrível, não?) e comprou a casa.

Mamãe contou-me tudo isso hoje à tarde, em sua casa no Sumaré, onde nasci e onde ela mora há sessenta anos. Lélia morreu em 2002, no caminho para São Lourenço. Aécio faleceu em 1988. Mévia está infelizmente doente há anos. E Astarté, a primeira filha, que morreu às vésperas de completar seis anos de idade em 1924, tem sua história também.

Uma tarde, uma amiga de vovô e de vovó foi visitá-los e queria conhecer os filhos. Vovó chamou-os para a sala (depois de dizer "não pensem que vão ficar lá: é só para cumprimentar, dizer o nome e sair de fininho" - criança não tinha vez nos anos 1930) e depois de conhecer os quatro, perguntou a Sud: "quem é aquela menina de olhos azuis?", ao que Sud respondeu: "é a Lélia". Ela falou: "essa, não, aquela, menorzinha, ali atrás" e apontou para um quadro com a fotografia de Astarté.

Todos gelaram. A moça pediu desculpas e disse que era vidente, que não queria assustá-los. A cena foi presenciada por minha mãe.

quarta-feira, 12 de maio de 2010

A LEOPOLDINA CAPIXABA


Em setembro de 2008 visitei a cidade de Alegre, no Espírito Santo, por causa de um gentil convite do Instituto Histórico e Geográfico de lá. Já devo ter comentado esta visita neste blog.

A cidade é pequena, mas muito simática. Cortada pelo córrego Alegre, este tem nos limotes da zona urbana uma altíssima cachoeira que é uma das coisas mais belas que já vi.

Outra coisa que me impressionou foi este solar na praça principal, que originalmente pertenceu a uma das famílias mais influentes de lá.

Típica casa de esquina, como há muitas em São Paulo, por exemplo, tinha a residência no segundo andar e as lojas embaixo. A parte de cima está hoje abandonada. Vejam, porém, na foto acima, a imponência da construção. A foto acima foi tomada por mim durante essa visita.

São nestas pequenas cidades brasileiras que a tradição do nosso povo permanece viva na memória. Alegre ficava na zona da Estrada de Ferro Leopoldina. O trem de passageiros passou por ali até o ano de 1969. Após isso, os trilhos foram arrancados e a estação ficou às moscas. Foi recuperada pelo Instituto Histórico e transformada em sua sede. Próximo à cidade há três túneis da antiga linha, todos construídos em 1913.

terça-feira, 11 de maio de 2010

OS DESVIOS DE PRESIDENTE ALTINO

Foto tirada por mim em 2002, com o trem de cimento chegando à Cauê (no fundo). Reparar como ele passava junto à pista local da Marginal nesse ponto

Todos os dias quando vou de casa para o escritório passo pela Marginal do Pinheiros entre o Cebolão e a avenida Eusébio Matoso. No trecho entre as pontes da CPTM e do Jaguaré, à direita, ainda se podem ver os trilhos que parecem ali jogados, num trecho curto de uns 100 a 200 metros entre o muro de uma fábrica e a pista local da Marginal, depois de um depósito de cimento da Cauê que existe ali.

Eles parecem jogados e soltos, mas na verdade não estão: eles são o que sobrou de uma quantidade grande de desvios que se distribuíam pelo loteamento feito pelos Dumont Villares nos anos 1940, entre as avenidas Jaguaré, Engenheiro Billings e Presidente Altino que serviam a uma imensa área industrial entre o morro que ali existe e avança contra o rio Pinheiros e a Cidade Universitária.

Muitos dos trilhos estão ainda por lé, mas enterrados ou debaixo de asfalto. Perderam sua função já lá pelos anos 1980. Sobraram apenas dois, um ainda ativo que cruza a avenida Presidente Altino e que não pode ser visto da Marginal, e outro, que funcionou exatamente até o ano de 2002, que atendia o depósito da Cauê.

Vi muito esses comboios de cimento passarem por ali nos anos 1990 até 2002, quando também passava por ali quase que diariamente. Porém, a favela foi avançando e finalmente os trens pararam. Incrível isso. Um trem parar por invasão de uma favela. A partir de 2004 os trilhos junto à Marginal começaram a ser retirados e um conjunto habitacional começou a ser construído ali. Parte dos prédios em cima do leito que passava a Cauê entrando no sentido para o interior do loteamento.

Aqueles trilhos depois da Cauê que acompanham a Marginal ficaram ali esquecidos. Originalmente, eles seguiam até a avenida Jaguaré e entravam por ela. Já há muitos anos haviam sido retirados depois da última esquina da Marginal antes da entrada para essa avenida.

Curioso que a quantidade de trilhos ali era tão grande que uma vez, há não muito tempo, um jornal publicou uma fotografia aérea da ponte velha do Jaguaré sobre o Pinheiros, aquela de arcos que está espremida entre as duas pontes paralelas entregues em 1974 no mesmo local, dizendo que por ali passavam trilhos. Erraram feios, a ponte era somente rodoviária.

segunda-feira, 10 de maio de 2010

O CÓRREGO DAS CORUJAS

Não, esse não é o córrego das Corujas, mas ele pode ter sido assim há uns 150 anos atrás... esse é o rio Tatu, em Limeira, já não muito longe do rio Piracicaba, onde deságua

Caminhando hoje mais uma vez na região de Pinheiros, fui dar no bairro das Corujas, também chamado de Vila Beatriz. Por ali passa outro córrego: o córrego das Corujas. Basicamente, ele acompanha a avenida das Corujas, retificado a céu aberto, depois a rua Natingui (de longe) e finalmente está canalizado sob o canteiro central da avenida Frederico Hermann Jr, até desaguar no rio Pinheiros.

Como o rio Verde, nasce também nas encostas da antiga Estrada do Araçá (hoje rua Heitor Penteado). Dele dá para se escutar a água correndo... até pedras tem em seu leito, lembrando um córrego das montanhas. Só que, nesse caso, com um muro de concreto em suas margens. Está até que limpo (surpresa), limpo de aparência. Já de água deve ser poluído como os outros.

É impressionante se imaginar o aspecto que a região fora do Centro velho de São Paulo deveria ter até cem anos atrás, até um pouco depois. Paisagem de morros e montanhas, com inúmeros córregos e campos de pastagem, em sua maioria. Muita mata nativa. Tudo hoje cheio de casas, prédios, favelas e ruas pavimentadas, fora a sujeira, fora e dentro dos riozinhos.

O que mais me impressiona é que todos essas correntes de água não tenham sido preservadas em seu leito natural, mantidos seus campos e matas ao longo deles. Afinal, a área "perdida" em termos de construções civis - tanto ruas quanto construções mesmo - seria mínima em função da imensidão da cidade. Ninguém pensou nisso. Até pensou, como se vê em mapas antigos com projetos. Mas os sucessores rasgavam tudo e construíam sem qualquer controle, tanto governantes quanto proprieários de terras, grandes ou minúsculas. Uma pena.

sábado, 8 de maio de 2010

KASSAB DELIRA 2: O LIXO NA CIDADE

Visto do parabrisas do meu carro, o lixo na Marginal do Pinheiros logo após a ponte da Sorocabana está lá, aumentando todos os dias e nada se faz quanto a isso.

Ainda sobre o caso da demolição do Minhocão, o jornal O Estado de S. Paulo publicou hoje uma estimativa de custos para se fazer a demolição e as mudanças para compensá-la: avenidas, linha da CPTM subterrânea, pátios alterados etc., e chega à conclusão que tudo seria estimado em mais de 2 bilhões de reais, SEM CONTAR o que é impossível de ser cotizado no momento, como quanto custaria a modificação da linha do metrô já existente que passa pela Barra Funda, a terceira linha para cargas, relocação de fiação e galerias subterrâneas, etc.

Realmente, não é coisa para se brincar. Por outro lado, embora concorde que o Minhocão nunca deveria ter sido feito, que em 1969 era mais fácil se construir algo melhor como ligação Leste-Oeste, que o elevado é horrível e provocou - isso era previsível na época, mas ninguém se importou - uma degradação das avenidas Amaral Gurgel, São João e General Olimpio da Silveira, hoje ele existe, está lá e, embora sempre congestionado, não tem substituto a custo razoável.

Então, senhores que vivem nos prédios ao lado dele, que lutem por seus direitos: peçam incentivos do poder público para diminuir o nível de ruído, como vedações de janelas e policiamento decente e manutenção da parte "coberta" pelas pistas de forma no mínimo decente. Isto porque, em minha modesta opinião, o Minhocão nunca vai sair dali.

Por outro lado, seria melhor gastar todo esse dinheiro - que, segundo o próprio prefeito, São Paulo não tem, de acordo com o que ele falou alguns dias antes, citado em minha postagem de ontem - em outras coisas mais importantes. Vou dar meu palpite: limpar a cidade. Ontem mesmo, eu estava esperando um ônibus num ponto na Cardeal Arcoverde, quase na esquina com a rua Cunha Gago, em Pinheiros. Ô sujeira. Dirão que o povo não tem educação. Realmente, parte dele não se importa nem um pouco com a sujeira, mas é verdade também que naquele local não há uma única lata de lixo à vista. A solução: Além de colocar o cesto, colocar um funcionário de limpeza para fazê-la constantemente, de forma que, aos poucos, as pessoas que se utilizam do ponto se acostumariam em vê-lo limpo e pensariam duas vezes antes de jogar cigarros etc no chão.

Curioso que há um bar bem na frente do ponto. O bar é imundo. Parece que nem seus usuários nem o seu dono se preocupam com a sujeira nem na calçada em frente a ele nem em seus degraus de entrada. Fica realmente difícil dessa forma. Mas, como eu ando mais de ônibus nos últimos tempos, vejo também mais a sujeira da cidade, vendo-a "do alto" das janelas do coletivo. Está muito suja, e parece que só eu me importo... mas não é verdade, a situação não pode continuar assim.

sexta-feira, 7 de maio de 2010

KASSAB DELIRA

A nova avenida sobre os trilhos da CPTM não lembraria certamente os projetos do metrô da Light de 1927

Saiu hoje em todos os jornais a "nova" idéia do prefeito Kassab: demolir o Minhocão. Nada de diferente do que quase todos os prefeitos de São Paulo que vieram depois do seu construtor (Paulo Maluf - foi ele quem fez!) propuseram.

Ok. Vá lá. Mas o que ele propõe em troca? Demole o Minhocão e fica o eixo Amaral Gurgel-São João-Olímpio da Silveira com todos os semáforos existentes para escoar o tráfego? Certamente não dá, até ele concorda com isso. O que ele apresenta para aliviar a demolição é a construção de uma avenida expressa no lugar da linha de trem entre as estações do Brás e da Lapa. E a linha? Ah, essa seria rebaixada e "canalizada", como é o metrô e como o foram diversos córregos da Capital de São Paulo nos últimos cem anos.

Legal. Agora, no entanto, vamos aos problemas: primeiro, não foi ele quem há uns três-quatro dias atrás disse que a cidade não tem como pagar a dívida com o governo federal? Como ele pagará essa nova obra, certamente caríssima?

Segundo: onde será construída a linha para passarem os cargueiros que continuam a cruzar São Paulo conduzidos pela MRS e ALL? Junto com a linha subterrânea? Convenhamos, é um túnel muito longo para ser transitado pelos fumarentos trens diesel. Além do mais, uma terceira linha (ou quinta, se considerarmos que já existem ao menos quatro linhas herdadas da Santos-Jundiaí e da Sorocabana, pois eram linhas duplas - não há como reduzir linhas, com o movimentadíssimo sistema de metropolitanos de São Paulo). Então, há de se construir o ferroanel no seu tramo norte, que tem o mesmo problema do rodoanel na região: ecologistas que implicam com a mata da Cantareira.

Terceiro: sempre que obras desse porte são feitas em países que têm dinheiro e são governados não por impulsos, elas são feitas em tempo relativamente curtos: não se perdem anos com autorizações deste e daquele órgão nem com liminares impostas pela Justiça porque alguém está roubando ou por algum cosntrutor que não se conforma de perder a licitação.

Quarto: se a ferrovia vai ser rebaixada (tunelizada), ela precisará ser construída primeiro, para depois se remover os trilhos de cima e fazer a avenida (ah, como prefeitos adoram avenidas!). No duro, no duro mesmo, os prefeitos jogariam a linha para longe e que se ferrasse a CPTM e seus usuários.

Quinto: o enorme pátio da Barra Funda, feito para se unir as linhas da Sorocabana/Fepasa, Santos-Jundiaí/RFFSA (depois unidas na CPTM), Metrô e trens de passageiros de longa distância (estes de saudosa memória para os passageiros, não para os retrógrados governantes) vai para onde? Segundo o prefeito, para a Lapa. E aí? Todo o investimento vai virar sucata? As oficinas da Lapa terão de ceder seu lugar para este novo pátio, pois seria o único local disponível num local saturado.

Vejam o custo de tudo isso somente para se demolir o Minhocão por que ele é feio. Sim, ele é horrível, deteriorou mesmo as ruas por onde passa. Mas é um escoadouro que funciona, guardados os limites do tráfego paulistano. Deixe-o lá mesmo. Ou faça o seguinte: os investidores que ganhariam uma fortuna com a liberação de mais uma área para ser recuperada (veja-se Cracolândia, Itaquera, margens ferroviárias e mais outras eventuais citadas há pouco tempo pelo nosso imaginativo alcaide) é que devem pagar por todas as reformas. A prefeitura apenas supervisiona. Aí sim.

Finalmente, a pergunta: qual será a nova ideia do Kassab quando ele acordar? Devolver a terra para os Tupinambás? Será que eles querem?

quinta-feira, 6 de maio de 2010

A SOROCABANA E A LINHA DO JURUBATUBA

Assim era a linha em 1966, próximo à ponte da Cidade Universitária.

Desde 1929, quando a São Paulo Tramway, Light and Power, ou, mais simplificadamente, a Light resolveu retificar o rio Pinheiros para torná-lo parte do complicado sistema de abastecimento de água e de luz para a Capital que então crescia sem parar, a Sorocabana viu uma chance de chegar a Santos sem partir de Mairinque.

Na época, a ferrovia Mairinque-Santos estava em início de obras, com seus (por volta de) vinte túneis começando a serem escavados e uma previsão de alguns anos para ver a primeira ferrovia paulista afora a São Paulo Railway alcançar o porto de Santos.

Em 1938, a Sorocabana inaugurou a linha. Seus trens podiam vir do interior com café e outros produtos para descer a serra, entrando pela cidade de Mairinque sem precisar baldear para a SPR. Uma grande obra de engenharia e uma ferrovia muito melhor, sem dúvida, que aquela que já tinha feito setenta anos na mão dos ingleses.

Veio a guerra e os ingleses gastando fortunas para conseguir sobreviver a ela. Venderam tudo que podiam para levantar fundos para custear uma guerra longa e sangrenta na qual viram seu poderio secular desabar e cair no quintal americano. Em 1944, venderam para o governo federal a ferrovia São Paulo-Paraná, enquanto sua empresa de colonização do Norte do Paraná, um dos negócios mais bem sucedidos do mundo, foi vendida para um grupo de empresários paulistas (para quem não sabe - a empresa ainda existe!).

Em 1946, cessava a concessão para uso da SPR. A ferrovia teria de ser entregue para o governo de volta. De volta, não: quem a construiu foram os ingleses, depois de puxarem magistralmente o tapete do Barão de Mauá. Agora, porém, nem tentaram negociar: entregaram de vez para o governo, que, em vez de cedê-la à Companhia Paulista, bastante interessada, ficaram com ela e a transformaram na E. F. Santos a Jundiaí. Afinal, os ingleses não eram mais monopolistas, e, pior: com o concorrente (a Sorocabana) tendo uma ferrovia mais moderna.

Com o rio Pinheiros retificado já, a Sorocabana resolveu fazer uma nova linha: saindo da linha-tronco, mas bem mais próximo à sua estação inicial de Julio Prestes, mais precisamente logo depois da estação de Imperatriz Leopoldina, próxima da junção dos rios Tietê e Pinheiros, essa linha acompanharia o rio Pinheiros até cruzá-lo bem mais ao sul, na região de Interlagos, e, daí, seguir por terras ainda pouco habitadas até a estação de Evangelista de Souza, na beirada da Serra do Mar. Ali a nova linha encontrar-se-ia com a linha vinda de Mairinque.

Não pesquisei, realmente, os verdadeiros motivos que levaram a Sorocabana a construi-la: acredito que um dos motivos seria a facilidade de triagem na estação da Barra Funda, então um enorme pátio de triagem de mercadorias, de tudo que vinha do interior. Afinal, fazer a triagem em São Paulo e retornar para Mairinque para descer a serra não facilitava a vida de ninguém.

As obras demoraram mais do que se imaginava, mas em janeiro de 1957 a linha estava aberta. Com ela, criou-se também uma nova opção de linha de passageiros para os bairros da zona Sul de São Paulo e também para Santos. Com certeza este não era o principal motivo de abertura da linha: era apenas um sub-produto. Além do mais, Santo Amaro ainda era uma região não muito habitada, e o rio Pinheiros retificado estava com milhares de metros quadrados de terrenos vazios. O tempo passou rápido para São Paulo e a Sorocabana: em 1964, a linha já tinha um movimento razoável de passageiros e fazia uma rota de subúrbio entre Julio Prestes e Evangelista de Souza. O movimento de cargas ia bem, tão bem que, na relação de linhas "anti-econômicas" apresentada ao governo federal, a Sorocabana falava em erradicar a linha Marinque-Evangelista, então com menos de trinta anos de operação.

Seria um enorme erro de difícil reparação se alguém não tivesse tirado a linha da lista e a mantido em operação: hoje, é uma das linhas mais movimentadas do Brasil e uma das poucas do anel ferroviário de São Paulo, evitando uma passagem de toneladas de produtos em comboios longuíssimos pelas congestionadas linhas da Capital, hoje abarrotadas de trens da CPTM.

Por outro lado, nos anos 1970, a Fepasa, que operava as linhas de subúrbio da Sorocabana, já não dava conta desse transporte com suas estações já ultrapassadas e ainda por cima de difícil acesso, com a construção da Marginal de forma a deixar a linha espremida entre a pista e o rio. Uma reforma foi feita no final dessa década, mas o resto dela somente se completou em 2000. Hoje, tem muito tráfego, é operada pela CPTM desde 1994 e vai muito bem, obrigado... mas tudo é novo. Por outro lado, não há cargas na linha desde o final do século.

E também sem os antigos Caveirões, apelidados pelos usuários devido a serem carros feitos a partir de antigos vagões sem janelas, e sem os Carmem Miranda, comboios que trafegaram nos anos 1970. Nenhum deles, no entanto, dignos de serem utilizados numa linha tão promissora.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

SÃO PAULO 1916


O mapa acima foi publicado no Almanach para 1916 do jornal O Estado de S. Paulo. Foi desenhado pela Prefeitura do Município de São Paulo em 1915.

Naquele tempo o município era dividido em zona urbana, da qual fazia parte a zona central, a zona suburbana e a zona rural. Notem os limites da cidade com relação à zona suburbana e reparem que tudo fora disso já era zona rural.

Nesse tempo o município ainda englobava a atual Osasco e não englobava o município de Santo Amaro, anexado em 1934. A divisa estava na região da Cidade Jardim, córrego da Traição (avenida dos Bandeirantes) e região do córrego do Cordeiro.

Meus agradecimentos ao Daniel por ter escaneado e me enviado o mapa.

terça-feira, 4 de maio de 2010

DO ALTO DESTA TORRE CEM ANOS VOS CONTEMPLAM

O local nem é tão alto, mas a amurada é estreita: dá o equivalente a uns 5 andares de um prédio de apartamento. Quem tirou as fotos mesmo foi o Douglas...

Conforme postado por este blog na semana passada, eu e o Douglas Nascimento fomos até a Igreja do Sagrado Coração de Jesus, tendo subido até o alto de sua torre para tirar fotografias que pudessem ser comparadas com uma que havia sido tomada no início do século passado do mesmo local.

A fotografia foi tirada no sentido da rua Santa Ifigênia. Como a região se degradou durante os últimos sessenta anos, especialmente pela existência de duas estações ferroviárias que deixaram de ser o ponto de partida e chegada das classes mais abastadas da população, assim como da construção de uma estação rodoviária que ajudou bastante o processo embora tenha durado apenas cerca de vinte anos no local (saiu de lá em 1982 e hoje o seu prédio está em processo de demolição), a demolição de casas muito antiga foi estancada a um devido momento, tendo várias delas sido conservadas - se é que esta é a palavra adequada - justamente pelo seu abandono, aliados às hordas de drogados que invadiu a região nos últimos anos tornando o local a "Cracolândia".

No site SÃO PAULO ABANDONADA, o Douglas postou ontem as duas fotografias. Bondade da parte dele, a fotografia original não foi "descoberta" por mim: foi apenas encontrada uma reprodução dela em um guia do Estado de São Paulo editado em 1912, depois de anos sem tê-la visto em outras publicações.

Note-se na fotografia as três casas da frente (lado direito) em primeiro plano, ainda de pé (da primeira delas sobrou apenas a metade direita). A casa verde à esquerda (esquina da alameda Dino Bueno com rua Helvétia), bem como a casa marron-escura a seu lado ainda existem, algo modificadas. Nas fotos, a rua Barão de Piracicaba aparece à direita, sentido alto da foto e a Dino Bueno é a da esquerda. A primeira rua paralela em frente ao largo é a rua Helvetia. Ao fundo, a rua que segue bem no centro, sentido alto da foto, é a rua Santa Ifigênia. Ao lado esquerdo do seu início, uma casa comprida dando frente para o que hoje é a avenida Duque de Caxias ainda sobrevive também e em bom estado, sendo uma loja de sapatos.

A estação da Luz, antes com um andar, hoje tem dois; já a Julio Prestes não existia, nem o prédio do antigo DOPS havia sido construído (foi-o em 1914), para ser a segunda estação da Sorocabana. A primeira estação, a original, pode ser vista com dificuldade, de tão pequena que era.

Enfim, um exercício de achômetro para todos. As fotos podem ser vistas aqui, juntamente com o artigo do Douglas.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

O "ATÉ LOGO" DO TREM A AMADOR BUENO

Last Train to Clarksville, isto é, Amador Bueno (desculpem a nossa falha). Foto Carlos R. Almeida em 30/4/2010

Neste sábado não foi alarme falso: o "Toshibão", ou, como dizem as más línguas, "Sucatão" fez sua última viagem no trecho Itapevi-Amador Bueno-Itapevi, na linha da velha Sorocabana, hoje CPTM, em São Paulo.
Depois do trem Jurubatuba-Varginha, desativado pela CPTM no final de 2001, somente sobrava este trenzinho, sujo, todo pichado, amassado, que somente não andava de portas abertas porque a CPTM dava a manutenção para isso (meu Deus! A última coisa que a CPTM queria era ser comparada com a Flumitrens, lá nos trechos de Niterói a Itaboraí (este extinto há três anos) e Magé a Guapimirim).

O trecho era gratuito há anos. Quem pegava o trem em Amador ou nas estações de Ambuitá (corruptela de Amador Bueno e Itapevi), Cimenrita e Santa Rita, não pagava passagem. É claro que isto ajudou esse trem a ficar cada vez pior. Com bitola métrica e não larga como é da Júlio Prestes até Itapevi, além da densidade populacional deste trecho não ser grande coisa se comparada com o resto do trecho (a Sorocabana sempre teve bitola estreita, métrica, a linha somente passou a ter bitola mista com a remodelação da linha até Itapevi pela Fepasa em 1979), esse trem já foi ameaçado de desativação várias vezes nos últimos dez anos.

A última delas foi em 10 de outubro passado, quando fui até lá para andar pela última vez (e pela primeira!!!) na linha. Era um sábado e já havia promessas de se fazer a desativação apenas pelo tempo necessário para se reformar a linha (aumento de bitola) e as estações, realmente em estado terminal - são, no duro mesmo, simples paradinhas. Como agora.

Naquele dia, alguém voltou atrás e o trem não acabou. Desta vez, acabou, com direito inclusive a discurso de altos funcionários da CPTM na praça de Amador Bueno ao lado da estação, explicando que um ônibus fará o mesmo percurso durante o ano e meio de interrupção do trenzinho.

Esperamos que ele realmente o trem volte e no prazo estimado. Alguns dizem que será uma continuação operacional - o trem iria de Julio Prestes a Amador Bueno. Outros, que uma composição menor, mas decente, fará o percurso que acabou anteontem - mas com bilhete pago.

É esperar para ver. Realmente, esperamos ver acabado o longo período em que os trens acabaram para dar lugar a linhas de ônibus. Esta provisória vai passar por ruas poeirentas, esburacadas e cheias de lombadas e valetas para atender aos antigos usuários.

(Nota de 26/1/2020: o trem realmente voltou, com estações novas - menos a de Ambuitá - no dia 3 de abril de 2014 e funciona até hoje)

domingo, 2 de maio de 2010

O CÓRREGO VERDE

Mapa da região de São Paulo que contém a bacia do rio Verde, assinalada em vermelho com seus dois braços e seu pequeno afluente no Jardim Europa. Perdoem-me o traçado, pois estou muitíssimo longe de ser um expert no paintshop.

O córrego Verde, também chamado antigamente de rio Verde, desagua no rio Pinheiros, atrás do clube Pinheiros, passando dentro do Clube Hebraica. Está praticamente todo canalizado hoje, sendo possíveis exceções fundos de casas por onde passa - esta confirmação é difícil pois teríamos de visitar todas essas casas para conferir.

Ao contrário da maioria dos rios e ribeirões da cidade que antigamente corriam a céu aberto, o córrego Verde não deu origem a avenidas de "fundo de vale". Tem dois braços. O que a Prefeitura chama hoje de "braço 1" nasce no alto da Vila Madalena, divisa com a Pompéia, nas imediações da rua Heitor Penteado e próximo a onde hoje está a estação Vila Madalena. Desce acompanhando a rua Simpatia, cruza a rua Inácio Pereira da Rocha onde esta cruza as ruas Belmiro Braga e Girassol, junto ao Cemitério São Paulo, segue acompanhando o lado direito da rua Fradique Coutinho, cruza a avenida Rebouças na altura da rua Capitão Prudente e junta-se com o "braço 2" na rua ali no Jardim Paulistano, junto à rua Mariana Corrêa.

O braço 2 nasce no alto do Sumaré, próximo à esquina das ruas Amália de Noronha e Oscar Freire, junto à estação do metrô do Sumaré, desce cruzando a Cardeal Arcoverde na esquina com a João Moura, atinge a rua Henrique Schaumann e cruza a avenida Rebouças na esquina com a rua de Pinheiros. Dali desce pelo meio do bairro do Jardim Paulistano por ruas estreitas onde se encontra com o braço 1 do córrego ali na Maria Carolina.

Até uns 30 anos atrás era possível se ver o córrego onde hoje está a pequena rua chamada "Verde", entre a alameda Gabriel Monteiro da Silva e a rua Grécia. Dali ele segue cruzando a Faria Lima entre as ruas Grécia e Iramaia e segue pelo meio de terrenos até entrar no Hebraica e desaguar no Pinheiros.

O seu trecho dentro do Jardim Paulistano era provavelmente o limite da antiga chácara "Bela Veneza", que existiu até cerca de 1910 e deu origem ao Jardim Paulistano e partes dos Jardins América e Europa. Não tente achar o córrego hoje. Ele está bem escondido. Sua localização foi possível por meio de mapas de época, dos tempos em que ele ainda não era canalizado.

O seu "braço 1" se manifestou iradamente há pouco mais de um mês atrás, quando a baixada da rua Inácio Pereira da Rocha, esquina com as ruas Girassol, Fidalga e Belmiro Braga, inundou e deixou diversos carros boiando no cruzamento. Parece que o velho córrego gostaria de ter um tratamento melhor do que servir de galeria pluvial (e de esgoto, claro).

No mapa acima, clicando e vendo sua versão maior, poderá ser visto os seus dois braços e um pequeno afluente que nascia ali perto da rua Groenlândia, junto à rua Polônia. Esse pequeno ribeiro, parte da bacia do Verde, é um dos limites do loteamento original do Jardim Europa. Em suma, está cada vez mais difícil encontrar-se um córrego a céu aberto em São Paulo.